quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Crônicas de mim mesmo "Em véspera de Natal"


Pinheiros sintéticos, luzes que piscam. Ânsia de consumismo globalizado, crença em menino santo. Eu sei hoje é véspera de natal.Sei porque meus vizinhos viajaram, meus cachorros já anseiam os rojões da meia noite. E eu aguardo os fogos de minha solidão.

Passo pelas igrejas, faces de anjos traduzem pra mim o que os santos teimavam em dizer: Aleluia cristo nasceu!

Viro a esquina e uma velhinha me implora ajuda, pois não consegue levar os alimentos para ceia de hoje à noite. Um garotinho de rua observa melancolicamente as sacolas de presentes irem e virem nas mãos das pessoas que passam pela avenida. Certas vezes não basta acreditar em papai Noel, penso eu. A realidade é dura demais para que se possa sonhar com brinquedos. Por que será que o natal é tão diferente entre as classes? A mesa farta, os presentes embaixo da arvore. O espumante estourado, o brinde com vinho, mas não falávamos em cristo nesse instante? A idéia não era ajudar ao próximo como a si mesmo? A idéia não era ter sentimentos de amor ao invés de ter um pernil jogado fora na manhã seguinte?

Onde foi parar o espírito natalino?A não ser nas lojas de guirlanda, nos piscas importados da China. Nas estatuetas de São Nicolau, agora vestido com logotipo da coca cola.
Parece que os anos passam e perdemos o senso de partilha. Por que é tão difícil oferecer algo sem ter algo em troca? O natal deveria ser uma data de boas ações, de sentimentos renovados. Eu não sou cristão e muito menos pertenço a classe dos voluntários, entretanto sei que enquanto deixarmos o mundo de lado e vivermos de acordo com nossas necessidades, maremotos irão afundar navios. Crianças irão se tornar homens bombas e o natal perdera esse senso de bom senso ,renegado em compras e bebidas numa eterna meia noite sem sentido.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Paliativo:



do Latim. "palliat".,

Que só tem eficácia momentânea ou incompleta;
que apenas serve para paliar;
s. m.,
medicamento que não cura mas mitiga o sofrimento do doente;

fig.,
delonga que mantém uma expectativa;
dissimulação;
paliação.

Parestesia (Por Gabriele Fidalgo)


Guardei tua carta, enquanto vasculhava a mente em busca de palavras que pudessem justificar todas essas coisas que você me diz com tamanha mágoa. Meus olhos deslizaram pelas linhas tortas das tuas palavras duras, e eu tinha vontade de afogar-me nesta raiva exacerbada com que me espanca. Me batendo com frases diretas, segurando-me pelos cabelos, apertando meus defeitos, e sufocando a lembrança viva do meu pensar confuso.

É verdade, eu enfiei um estilete curto e afiado dentro de você. Vi teu coração bater, e, mesmo assim, insistia em não retirar a venda posta em meus olhos. Meu receio era te ver com os olhos quebrados e com lágrimas inevitáveis escorrendo pelo rosto. Tive tanto medo do sentimento que pulsava em teu peito, que pulei de teus braços para cair num chão frio, áspero, seco. Tanto medo de acabar completamente coberta por teus lábios, que corri o mais rápido que pude, tampando os ouvidos e soando frio. Você me olhava perdido, me observava desencontrado da realidade, engolindo as palavras erradas que eu te disse, quieto.

E eu sei. Sei que eu deveria ter sido devorada pelo fogo com que você aquecia as minhas noites claras. Minhas noites confortavelmente aconchegadas pela tua voz forte e por teu sorriso leve. Noites que abandonei numa estação de ônibus, após descobrir tua passionalidade.Li tua carta esperando que soubesse o que estes verbos significariam em mim. Torcendo para que compreendesse que uma carta de amor mal resolvido, tem poder de revirar todas as canções antigas e deixadas num armário qualquer.

A tua ortografia me faz pensar que a solução é chorar. A lembrança dos teus olhos apertados e colados aos meus, provocam dores impossíveis de serem descritas, mas mesmo assim eu as revelo para você. Aperto-me contra uma folha de papel, e faço confissões que não poderiam ser perdoadas. Arrisco-me ao menos uma vez em tua vida. Ao menos para dizer que é minha culpa, a tua ferida. É tarde demais, você sabe. Eu errei com a fraqueza que você não conhecia. Deixei tudo assim, desarrumado. Deixei no teu corpo meu gosto transformado em podridão. Deixei em teus cadernos a marca da minha ausência.

Deixei no teu café o gelo do meu descaso. Descarada, errante, pequena para os teus sonhos grandes e para as esquinas da tua cidade.É tarde. Peço perdão por ainda precisar decifrar nossa despedida.

Paliativo (Abandono)


Cotovelos estendidos numa mesa, o reflexo das sobras de um suposto jantar. As janelas são feitas de plástico condenado. Condenam em retângulos retos a vida das ruas que meus olhos não enxergam. Minhas costas se cruzam na cadeira, meu pulso está firme e logo bafejo o sono...
“Ela se foi...”

Tomou o barco na noite escura, deixou suas marcas escondidas pela casa, traços em meu coração! Uma musica que ausenta o silêncio, os recortes de jornais passados, rascunhos mal desenhados de uma história sem meio, imposta e composta em meus dias maus somados!

"Ela se foi...”

E não deixou vestígios de volta, recolheu suas tralhas e no fim se esqueceu de desligar a luz...

Minha casa vazia, ausente de claridade.... Estou hojeesperando que alguém me empreste velas, para que enfim possa enxergar meu reflexo outra vez!

Hoje, desencantado hoje! desfalecido agora!
Gostaria de dizer sinto muito, pelo menos iria sentir algo além dessa incoerente inconstância.
“Ela se foi...”
E não posso dizer o quanto sua imaginável presença me trazia conforto!

Não limpei minha alma desde então.
O tapete permanece bem ali, ao lado da mesa com as manchas de vinho adormecidas de um natal caloroso. Os retratos ainda estão no quarto a beira da cama. Trazendo-me a lembrança que tive sonhos uma vez realizados. Que vivi uma vida fora dos relâmpagos que acostumei observar. As cartas amontoam na varanda, esperando alguma resposta. Mas de respostas eu não entendo nada!

Sempre me disseram que a crueldade está nos sonhos, hoje eu consigo percebe-la no vazio dos corredores. Sonhos vulgarizam nossa realidade, provando que momentos que tivemos, momentos especiais e raros, jamais serão os mesmos. E que depois disso nada mais terá o mesmo valor.

Meu café da manhã agora é sem companhia, e o jardim o qual observei foi tomado por ervas daninhas. Agora! Sem mais flores... Sem mais brilho... Sem mais em ti!
Meu chá ficou amargo, minha manhã fria, meu lugar inerte . Sento-me só todos dias na varanda para que enfim possa ouvir outras vozes a não ser as minhas.

Sim! "Ela se foi..." E sequer mediu os preceitos, sequer pediu minha opinião.... Ou disse adeus. Ela apenas foi embora me esquecendo aqui!