sábado, 26 de dezembro de 2009

O Pessimismo Segundo Quem perdeu as asas!


A bomba estoura, não importa quantos panos você encubra... Uma dinamite sempre será uma Dinamite!
È tudo uma questão de química... Nitroglicerina pura! E ai meu irmão! Quando o negocio explode, você vê até as tripas dançarem!
E assim que as tripas dançam, é impossível ter o corpo limpo de novo!
Você pode contar um, você pode contar dois, pode contar até três. Mas nada volta! E o seu corpo ainda continua ensebado de sangue. Então você lava, mas ainda sente aquele cheiro, ainda imagina as células vermelhas cobrindo tudo... Droga! Você imagina... E fica imaginando toda aquele sangue coagulando seu corpo.

Então me diz qual é o seu discurso de otimismo pra isso?

O lance é que você não pode chorar porque sua mulher foi embora! Ou por abrir a tampa da latrina e encontrar um monte de fetos mal desenvolvidos boiando igual merda na privada... São apenas alguns filhos que não deram certo, certo?
Abortos incondicionais de alguma coisa que apodrece no seu braço e não tem como amputar!

È tudo uma questão de gordura! O negócio é sentar a bunda numa poltrona velha e assistir a merda de um filme tosco comendo feito uma vaca..
Quanto mais gordura mais fetos nascem no seu braço. Mas quem liga com um pedaço de carne morta, quando se tem metros e metros de carne nova ampliando em baixo da epiderme! È lógica pura!!!

Então me diz qual é o seu discurso de otimismo pra isso?

Todo dia um pássaro é morto por linhas embedidas em cerol...Todo dia aquelas mesmas asas permanecem quebradas, incapaz de voar! Incapaz de simplesmente voar!

Qual é o seu discurso de otimismo dessa vez?
Qual é o maldito discurso de otimismo que ainda faz com que você minta para os fatos?

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Meus nem tão complexos, sobre o então Natal

Estamos bem perto do natal, pouco menos de uma semana ou quase isso!
Antigamente eu ficava mais eufórico com essa data. Não sei se era por causa dos últimos dias de aula, ou pela espera ansiosa por um presente... Mas eu amava dezembro, amava ler histórias natalinas de renas caindo, ou de uma realidade de pinheiros e neve que eu nunca vi! Meus olhos brilhavam com os fogos da meia noite e como era bom! Como tudo era perfeito na véspera de natal!
Mas então o tempo passa e por algum motivo você entra na maldita idade da razão. E um condenado prova que o papai Noel é apenas um gordo rechonchudo filho duma puta que palita os dentes enquanto faz compras no Wall Mart!
São apenas cacos de um espelho quebrado. Todas aquelas coisas que você só consegue distinguir depois de um tempo, e depois define como complexo.
A escrota realidade do dia a dia!
E assim a ficha cai! Pequenas lembranças antes reprimidas numa espécie de proteção mental, agora escapam como ponto analítico disso que alguns nomeiam: “vida adulta”. Então todos os natais verdadeiros aparecem, em cenas curtas... Me lembro como se ainda estivesse lá. Tudo corria bem e já era meia noite, minha barriga estava cheia. E eu me encontrava deitado na sala assistindo a programação de natal. Quando uma briga de vizinhos invadiu meu mundo, algo que começou na rua e acabou no meio da sala de casa.
O marido cobria a mulher de socos. Enquanto o ciúme queimava sua alma... Da boca da mulher escorria uma saliva misturada ao sangue, que ela tentava encobrir através de um pano de prato com desenhos de flores que segurava contra a boca.
As filhas deles estavam ali, gritavam para que ele não batesse na mãe. E como éramos vizinhos a mulher pediu amparo aos meus pais, invadindo a casa como um fiel implorando clemência ao santuário...
—Por favor!
A mulher implora!
—Grrrr!
O marido rosna a ceia não foi o bastante para ele, ansia cada pedaço da carne dela.
E meus olhos fragmentaram cada minuto daquele caos natalino. A realidade é dura demais para algumas doses de espumante! Aposto que o marido daquela mulher bebeu algumas garrafas de velho barreiro com um pedaço bem suculento de carne de porco e sentiu igual ao animal que digeria! Não me lembro como acabou aquilo, mas não houve sirenes policiais... E pelo que eu sei, os dois estão juntos até hoje. (Acho que para algumas mulheres a força de uma pancada tem o mesmo encanto do que uma poesia sussurrada).
È claro que aquela cena acabou com a ceia de natal que acontecia por milagre dentro de casa. Minha família sempre foi um lar de opostos que se agüentam (ou tentam se agüentar). Portanto não havia ceias com grandes frutas e crianças brincando de pega-pega pelo quintal.
Acontecer uma ceia em casa fazia parte do que os padres chamam de milagre natalino, um milagre que se desmanchava antes da meia noite. E os cacos do espelho novamente eram jogados... Uma tia minha sempre bebia demais e acabava tudo na divina sinceridade humana. È como aquele provérbio antigo diz: In Vino veritas! (No vinho a verdade). E todos nos sabemos como a verdade reage com a hipocrisia!
As ceias acabavam em soluços de choro, ou risos de fuga em meio a caras desconfortadas das minhas outras tias. Contudo ainda éramos crianças não entendíamos a hipocrisia, só queríamos uma ceia de natal que não acabasse em intrigas. Meu natal nunca foi um natal comum, além da ceias desastrosas havia também os princípios dos meus pais sobre a lenda do papai Noel. Eles achavam errado influenciar a crença do bom velhinho.
Na concepção dos meus pais (especialmente da minha mãe) mentir para um criança dizendo que renas e o pólo norte guardam uma fábrica brinquedos é algo injusto. Portanto eles deixavam bem claro que aquele “velho barbudo” não existia. Com Papai Noel ou sem Papai Noel, mesmo assim eu e meu irmão tínhamos direito de escolher um presente de fim de ano.
O acordo era não “repetir de ano” na escola , e ter sempre boas notas, daí ganhávamos o presente desejado.
O engraçado que mesmo com meus pais deixando bem claro que a ficção do Papai Noel era algo bobo, eu (com meus seis anos na época) ainda esperava crente que ia ver um trenó sendo guiado no céu. Acreditei em Papai Noel mesmo sem ninguém ter me deixado acreditar!
Hoje apesar de não concordar, eu entendo o lado dos meus pais... Tiveram uma criação rústica (típica do interior) então achavam boba essa coisa de magia natalina. Meus pais sempre foram céticos em questão aos ritos sociais, ceias, ou ovos de páscoa e fadas do dente. Apesar de serem muito carinhosos nunca influenciaram o lúdico no nosso cotidiano, não faziam com que escrevêssemos cartas pedindo brinquedos, ou certificavam a existência de elfos no quintal.
Parece bobo, mas essas crenças infantis ajudam na formação mental de uma criança. Uma criança que acredita em algo bobo como a existência do Papai Noel, aprende a conquistar coisas impossíveis e cresce limpo de partículas de pessimismo na estrutura de sua personalidade! È obvio que uma criança que cresça sem sonhos lúdicos (sem a crença no velho barbudo), não vai ter fé em si mesma no desejo de coisas impossíveis! E assim não conquistar nada de porra nenhuma!
E esse nada de porra nenhuma, acaba com todo sentido de achar um sentido na vida!
Não vou enumerar o caos social em que vivemos. È fato que a nossa sociedade há tempos não forma princípios para um bom caráter ou ensina algum senso humanitário para convivência, quem dirá para a crença de algo tão bonito como o natal!
Todo mundo sabe, que o natal não se trata só de uma fé pós- cristã imposta pela igreja para gerar mais tarde (lê-se, hoje) os sorrisos de grandes empresários no lucro da venda. O natal é de um significado bem mais vasto, para não dizer mais antigo.
Os celtas já comemoravam o dia 25 bem antes de Jesus vir ao mundo. Na verdade todos os costumes referentes a essa data foram adotados (para não dizer roubados) pela cultura neo-cristã. E naquela época já era comum a união da família, a confraternização, dança e árvores decorada.
Pode-se dizer que esse sincretismo religioso uniu a “bom vinvancia” dos celtas, com o a face caridosa dos que ainda dividem o pão (os verdadeiros cristãos).
Para aqueles que pensam que o natal é apenas feito de algumas cervejas geladas e de muito espumante barato, eu deixo aqui a dica para ouvir uma boa música celta típica desse feriado. (vale até aquela do sapatinho na janela).
Talvez se as pessoas se embriagassem menos, e amassem mais a confraternização entre conhecidos e desconhecidos.... Talvez se ainda houvesse o hábito de contar uma história bonita para que as crianças pudessem sonhar a meia noite... Eu ainda guardaria a esperança de amar o natal como antes!
Pois, não importa o quanto às lembranças sejam fortes e tragam os cacos do espelho de volta. Se ainda houvesse calor humano, e não solidão... O meu natal seria menos solitário e crente desse amor que tanto faz falta nas pessoas!

Boas Festas!

domingo, 13 de dezembro de 2009

Contra indicação


Aqueles olhos expressavam dor. Tingidos de matéria, abriam e fechavam tecendo lágrimas...
E a dor habitou seu peito. No momento todas as portas se fecharam, e todos os demônios brotaram do inferno. Ele fechou os punhos e desacreditou em si mesmo.
E naquele instante, não mais que aquele instante, se esqueceu dos amigos e se deixou levar pela dor.
Os grandes feitos ilustravam sua mente (pequenos em questão de ato, mas grandiosos em virtude) o aborreciam ainda mais... Trazendo uma nítida noção de falha.
Ele recusou a vida, disse para as paredes que queria parar de existir.Foi até a esquina, entrou numa farmácia e perguntou para um atendente:
—Você tem algo para cessar a existência?
—O que?
Questionou o atendente. Naquela farmácia perguntas assim não aconteciam.
—Algo para parar de existir! Uma boa receita capaz de apagar toda essa matéria de carne talvez?
Tentou outra vez o moço, sendo um pouco mais explicativo.
—Desconheço algo assim!
Afirmou o atendente.
—Então o que me recomenda?
—Tempo!
—Por que tempo?
—È o ideal para os sintomas do senhor, já que nenhum ato de abolir a existência dura mais que algumas horas...
—E se durar mais que uma hora, o que eu faço?
—Espere mais uma hora! E depois mais uma hora, até que alguém toque a campainha e te chame para sair. Ou até cair uma garoa que vaze pelas goteiras e molhe seu rosto... E se isso te irritar. Espere alguns instantes com fé que a chuva passe. Para enfim ver o céu limpo!
—Eu não entendo esse remédio!
—Mas não é preciso entender, os remédios são todos assim... Basta ingerir algumas doses e logo você está bom! E no final você nem vai saber ao certo o que ingeriu!
—Tem certeza, que ficarei bem com esse remédio?
—Talvez!
—Talvez? Como assim talvez! Você não me garante melhora?
—Olha! Não existe uma contra indicação, mas como todos os medicamentos esse também têm reações adversas.
—Quais?
—Overdose de vida!
—E isso é lá ruim?
—Existe casos e casos... Um senhor que tomou o remédio semana passada, reclamava de ter uma vida vazia. Depois que utilizar a receita, ele conheceu a eternidade de um dia... E a vida vazia que ele tanto reclamava, virou algo cheio de coisas que ele mesmo não sabia de onde saía. Já para uma mocinha que também utilizou da receita, essa sensação de intensidade do dia valeu tanto que a coitadinha acabou ficando com overdose de tudo!
—Não me diga!
—Digo sim! O tempo pode ser algo assustador visto de um ângulo mais sensorial. Tempo produz vida. E uma vida intensificada em tempo, gera sinestesia aguda! È o que a super dose dessa receita traz... Vai levar?
—Vou tentar, quer dizer... Vou levar!
—Ótimo! Vou embalar para o senhor! Já ia esquecendo, o que levou o senhor a querer cessar a existência mesmo?
—Dor!
—Entendo! Então não seria melhor o senhor ter levado um Doralgina?

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Naipe rasgado



Existe uma vontade que cresce e avassala todo e qualquer sentimento de queda.

Algo que a manhã exala. Cheiro de recomeço!
Um escasso feito de paisagens conhecidas pelo mundo... Morros grandes, monumentos de cimento e grandes vales! Mostram o recomeço!
E então toda decepção acaba. Todos o erros são grafitados com uma escrita simples de uma miragem infantil: Recomeço!

O castelo de cartas desmorona pela brisa calma e confortadora... Entre reis e valetes, a dama de copas é a única que cai virada. A dama de copas incide em evidência enquanto tudo resta em ruínas: Recomeço!
O anti séptico arde posto na ferida aberta... A água tira os cacos que ainda permanecem presos na carne. Curativos aderentes: Recomeço!
Carro morto na contra mão... Buzinas e xingamentos de longa data... Ponto morto, chave enguiçada e o carro anda: recomeço!

O corpo colide com a terra sem pulsação iminente... Todos os segredos se perdem, todos os motivos acabam: RECOMEÇO!
Toda gota de orvalho, toda questão inacabada... Todo fim de tarde que guarda um desejo incompreendido... Desatado, desconexo ou vendido!

Restaure o Recomeço!

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Sono!


É sexta feira, imagino que toda sexta feira é igual a quase todas as sextas feiras. Eu não dormi na noite passada, portanto completo agora muitas horas de sono que não tive! A luz do monitor me mantém bem acordado. Não sinto sono, na verdade não quero sentir. Preciso equilibrar meus minutos perdidos, preciso dormir normalmente, pelo menos uma noite... Troco palavras com pessoas no Messenger, alguns olas, tantos outros tudo bem...
Será que tudo está bem mesmo? Depois de algumas horas totalmente desperto eu desencadeio pensamentos sem pensar. Estado alfa! Isso! Me lembro de ter lido isso numa maldita enciclopédia no trem. A mente fica área, formigamentos na mão, estado de criação suprema! Ritmo cerebral baixo e fala incoerente... Os sabichões dizem que entramos em alfa a partir da meditação, droga! Eu não meditei, só estou sem dormir! Tinha que entrar em alfa?
Tudo que eu queria nesse instante era não dizer o que sinto de maneira jogada! Devo ter discutido relações pessoais, casos antigos com ex-namoradas e temas políticos com todos os meus contatos do MSN.
Essas coisas afetam a mente!
Estou estimulado agora. Posso pular vinte cinco vezes e depois trabalhar em ritmo de maratona. Tomo banho em estilo karaokê, viajo toda linha musical dos Smits, fazendo o tom grave do Kurt. Saio do chuveiro ouvindo algo como acabar com toda água do mundo. È tanto exagero que dá vontade até de cai na cama e nunca mais acordar. Não!!!! Não posso dormir, ainda é preciso sobreviver a ao sono!
O maior inimigo de todos os tempos, o malfeitor dos insones. Aquele que faz com que você durma na poltrona do cinema, aquele que te derruba no ônibus lotado e as vezes até faz com que você babe na janela:O sono!
Mr: Sandman para uns, João pestana para outros. O sono é o começo do sonho, a partida para o pesadelo. O recesso da mente. Pode-se dizer numa linha mais poética que não vivemos sem sonhar. Assim como não podemos viver sem dormir. È altamente prejudicial à saúde do nosso corpo. Podemos atingir meses sem comer, mas poucos dias sem dormir!
Ficar três dias sem pregar olho pode gerar seqüelas gigantescas. Tanto é que na ditadura militar uma das piores torturas era deixar uma pessoa sem dormir. Só de pensar nisso me dá sono!
A maioria das pessoas que tem insônia procuram estimulantes para o sono. Leite com abobora, luz azul... È cada estimulante estranho que dá mais vontade de dormir. Sempre achei que o maior estimulante para sono é permanecer acordado! Parece idiota, mas o sono dá sono!
Enquanto escrevo isso eu o vejo anoitecer o dia, minhas pálpebras já recusam ficar olhando as palavras. Quando estava no ônibus tudo que tive vontade fazer era dormir. Deitar-se na cama e logo entrar no mundo de Morpheu. Invadindo o domínio de Hipnos... Até o galo cantar na manhã seguinte.
Dormir e acordar. Sina nossa de cada dia.

sábado, 28 de novembro de 2009

Coisa nula!


Doenças novas que são catalogadas... Toxinas desconhecidas que limitam o corpo a cair. Todos os dias um túmulo novo é levantado. Todos os dias... Ossos que se encontram com a terra.
Vida que morre!

Minha clarividência está nas pessoas vivas, enxergo cada fantasma num distinto lugar. Eles não existem mais. Perderam aquilo que os distinguia. Eles não existem, pois deixaram que todas as reações mínimas perdessem o significado. Eu não acredito em espíritos desencarnados, mas já vi esses feitos de carne. Encarnados numa trajetória sem sentido.

São niilistas, gananciosos e estão por toda parte.
Conceituam uma extensão de coisa perdida, uma compaixão compacta e resumida...
Colecionam livros de auto-ajuda... Negam a existência em conjunto com o outro, tentando dissertar o que é viver!

Nada de estudar com a história, nada de ouvir o que mais um tem a dizer. A surdez é algo que a espécie precisou desenvolver. Foi necessário não ouvir para resistir. Foi necessário tampar as orelhas para garantir um pão na mesa, um café cheio de hipocrisia.
Negar para ser negado!

Lema constitucional das escolas públicas. È tanta demagogia que palavra em si perde seu significado.

Sempre cercados, sempre envolta... Sempre sozinhos temendo a si mesmos. Temendo uns aos outros. Niilismo conformado.
Acredita em fantasmas?

Esses que cercam paredes, esses que correm ao banco. Esses que vivem uma vida morta e desgastada.

Espectros voluntários de cor nascente. De vida transparente, vivendo a resolução de cada amanhã consumado.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Toujours

—O que é uma alma?
Pergunta a garota, ingenuamente olhando o teto.
—Acho que é algo que a gente enche de coisas e cobre pra ninguém ver! Algo que faz a gente pintar figuras na folha.
Responde o rapaz com uma expressão de quem sabe muito sobre almas.
—Pensei que alma fosse aquele papel que a gente usa embaixo da folha!
Aguça ela.
—Não! Aquilo se chama, papel que se usa embaixo da folha... Alma é algo muito complexo.
Completa ele.
—Eu acho que eu não tenho uma alma!
—Claro que tem! Todo mundo tem alma, uns tem alma de artista outros de agricultor... Conheci uma garota que tinha alma de vaca!
O silêncio cresce, a garota odeia quando o assunta chega em outras que não seja ela. Depois de algum tempo ele corta o clima:
—Você quer?
—O que?
—Minha alma! Ela só me trouxe problemas até agora, se quiser pode levar...
—O que eu vou fazer com duas almas?
—Eu não sei! Nem sei o que faço com a minha!
—Acho que eu não quero não!
—Então ela vai pro lixo! Ta ocupando muito espaço, sabe? Quase todo o meu ser! Me decidi, vou jogar fora! Afinal ninguém gosta dela mesmo. E eu vou acabar morrendo de febre por escutar a minha alma no pedido por chuva!
—Tudo bem! Eu quero vai!
—Tarde demais, já foi para o lixo.
—Ahhh! Mas eu queria!
Suspira a garota... Suspira porque ela o ama e sente isso na alma. Algo que brota intensamente trazendo a necessidade de falar com ele, algo que ela não consegue expressar. Algo que a faz divagar em pensamentos na aula. Algo que agora ela sabe definir bem!
—Tudo bem! Eu a reciclo é sempre bom reciclar uma alma...
—Se você quiser... Podemos compartilhar a mesma alma!
—Eu...
O rapaz fica calado, e ela o beija... Os olhos dele traduzem o que alma intensifica: amor.

Um País


Eu criei um país para vivermos em paz. Eu e você, você e eu!
Escondido das desilusões, perto de todos os sonhos...

Nosso país não possui distância, nem preconceito, despeito ou ganância. Lá a neblina é alta e a grama verde clara. Tão imensa e acalorada que desbota por toda serra até a costa.
Lá, os habitantes só falecem por desgaste de vida, quando aposentam ou somente quando o sonho se realiza.

Em nossa terra não há haverá limites de população, taxas ou períodos de desilusão amorosa.
Teremos todo um continente para nos amarmos sem interferência de quilômetros, chacinas ou desamparo financeiro. Teremos nossos encantos em meio de cantos e de tantos apegos. Sem guerras, ou finais sozinhos... Criaremos leis de amparo amoroso, abraços coletivos e festas anti solitárias. Para nunca sobrar tempo a melancolia...

País que se localiza bem ali em qualquer lugar, na esquina na rua na beira do mar.
País perfeito este...
Que estará onde você está!

sábado, 7 de novembro de 2009

Sabado para quem quer sabado!


È a merda de um sábado chato! As pessoas andam pra cima e pra baixo com guarda chuvas para tampar o fator gama do sol. A maioria nem sabe disso, não sabe do câncer de pele, da radiação solar ou sobre novo filme do Hulk! A única coisa que é exata fica com que as novelas dizem ou a moda de andar com uma “sombrinha “ com a cara da Madona estampada na lateral.

È sábado e o tédio parece arrancar cada centímetro do meu pulmão. Metade dos meus amigos desceram para Praia a outra metade faz cálculos para faculdade de engenharia. Já repassei mil vezes um evento que eu possa fazer, mas é tedioso demais. Poderia ir ao Shopping tomar um refresco, mas seria solitário passar um sábado olhando o reflexo de um copo de suco! Poderia ir ao cinema, assistir um filme nacional para rir de algum palavrão de excesso dramático, contudo o clima romântico de sábado num cinema me deixaria deprimido!
Revejo os números da minha agenda eletrônica no celular e nada... Somente uma mensagem de fora de área! Se não me faltasse carro ligaria o motor e dirigiria até encontrar o último por do sol.
Ah! Tudo é tão sábado... Tudo tão cidade pequena, de dia atrasado de nada a fazer.
Sento no sofá e abro as centésima pagina de uma biografia idiota de um escritor Best seller. Não faço idéia quantos livros consigo ler quando o tédio maltrata minha alma. Eu sei que daqui a pouco vai vir o desespero. Começa com a falta de inspiração, depois vem  a culpa, o medo, e por último o desespero! Quando isso chega não importa quantas linhas você leia, sua vida fica sem sentido. E quando a vida fica sem sentido todo sentido é um sentido perdido!
È sábado e aposto que algum judeu proclama Sabbaoth em alguma sinagoga em Israel.

Sábado que acordei em instante agora... Sábado com trilha sonora acelerada.             
Eu sei os poetas não deveriam viver tanto! Sou o único da minha época vivendo um sábado de lentidão.
Alterno não sei quantas canecas de café para ver se meu estimulo chega, minha esperança dilui em liquido negro açucarado. Meu dia é uma ulcera descafeínada, cheio de bancos que deixam resíduos de má postura. Cheia de talento mal desenvolvido, sem diploma universitário, sem livro publicado. Meu dia é um sábado parado, um sonho quebrado cujo final sempre acaba na melhor parte. Sempre acaba na tarde de um sabado chateado.

domingo, 25 de outubro de 2009

O Velho


Estanco minhas hemorragias fechando as janelas da casa. Sangro pelos poros da mão, mas não sou santo. Pelo contrário, faço parte das palavras de orgulho, das canções de desespero e dos dias de depressão. Eu abandono pessoas, faço com que elas se suicidem de mim... Assim como me suicido delas. Levo gritos em minha mente, coleciono lágrimas dentro de garrafas plásticas. Comercializo minhas repugnâncias e meus desesperos de vida.
As crianças me olham como a lenda de algo terrível. Já as senhoras acham que sou apenas mais um velho solitário. Exclusivamente alguém que perdeu a alma junto ao abandono do amor. De algum modo ambos estão certos, pois existe algo mais terrível do que amar em abandono, existe?
O dicionário me define como sobrevivência, talvez pelo fato de sobreviver ao meu reflexo todos os dias. Meus companheiros de silêncio estão nas paginam secas de um livro. Passo horas conversando com Baudelaire, minutos debatendo com Blake, enquanto tento me convencer que a voz de Eleonora de Poe não são as de minha falecida que nunca retornou.
Sim! Eu já senti o amor... O mesmo amor composto nos cânticos dos bardos antigos. Aquele capaz de iluminar a alma numa existência composta em mil maravilhas. Amor desses de Taj Mahal, desses expostos nos corações dos poetas... Sim! Eu senti amor uma vez... Uma única vez!
Tudo o que sobrou disto, fora apenas o apelido...E daquele nome por muito tempo fiz-me abrigo.
Olhos de anjo, lábios de ópio... Lábios que me viciavam... Acho que hoje a chamo de solidão. O único nome que ainda resta em minha memória.

Condeno o amor como condeno a mim mesmo, jamais haveria chorado se ela não tivesse partido. Jamais teria amado se ela não tivesse existido. Tenho certeza que foi o meu amor que a matou. Todas as horas que passei contando histórias de como iríamos ficar juntos. De como teríamos uma vida, uma casa e uma sacada repleta de crianças e vasos de flores perfumadas. Meu amor foi fatal a ela. O modo como meus dedos se entrelaçavam junto aos dela... Dizendo que poderíamos olhar uma vez mais para o futuro e descobrir vaga- lumes no quintal.
—Sonhos—Eu dizia—Respire os nossos sonhos...
Mas ela não respirou... Não acredito em doenças cardíacas. Na minha opinião o coração tem uma única função... Amar! E por isso não fui capaz de salvá-la, ao contrário do que pensam não foi o excesso do meu amor que a matou e sim a falta dele... Eu não dei amor necessário para que aquele coração pudesse sobreviver... Eu a matei por sentir tanto amor e ao mesmo tempo não conseguir expressa-lo de maneira sutil.
Condeno o amor, não por ela, mas por mim. Por perturbar sentimentos que já não existem.

Minha amada está morta! E logo eu estarei. Nada vai mudar isso, nada que eu diga o sinta a traria de volta... Então vivo na fortificação que inventei, distante dos outros sem esperança que um dia respire o ar de convivência outra vez.
Eu me privo dos outros, e respiro meu individualismo seguro. Sendo eu o monstro gerador das lendas. O velho solitário, alguém que não acredita na humanidade... Amargurado por tanta falta de senso das coisas. Brigado com tudo que é sagrado. Iludido de tanta desgraça. Desacreditado nisso que dizem sobre viver em comunidade.
Sozinho esperando o inverno passar.

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Sobre raios e trovões, histórias e destino!


Noite estranha, dia meio que pela metade. O sol bateu na janela o celular tocou algumas vezes. Pessoas vieram me chamar e a televisão foi desligada pela tempestade. Fiquei na cama pelo sono da madrugada. Cada minuto depois das doze é uma linha recém completada, inspiração vem e inspiração vai! O texto compõe-se de várias poesias, mas nada que me de a esperança de um livro lançado. Eu encho a caneca de café.... Argh! Está frio, muito tempo parado na garrafa térmica. Dias em que o café permanece frio são piores do que dias em que você levanta tarde e descobre que a chuva caiu. A chuva cai, e sempre molha as roupas que minha mãe coloca no varal. Sempre tenho que desligar os aparelhos elétricos por causa disso... Por causa desses relâmpagos inconseqüentes, que sempre me fazem sair da internet. Perder o último capitulo da serie na TV. Perder a última conversa decisiva no MSN. Relâmpagos grosseiros que caem e nem pedem licença! Que difícil é essa convivência natural entre raios, relâmpagos e trovões. Eles caem do céu eu acho... Riscam todas as nuvens, desviando os destinos. Fazendo com que o coração pule de susto. São espíritos irado da grande mãe. O indicio breve de que

“Puta que pariu, vai cair mo pé d água no barato”.

Sempre penso nas pessoas que levam um raio na cabeça. Li certa vez que isso é devido os atos encrenqueiros e maliciosos que elas tendem a fazer em vida. Uma lenda africana diz que xangô o senhor dos raios (e meu guardião pelo que uma vez me disseram) julga os ladrões com uma “raiada”na cabeça. Na Grécia Zeus também fazia o mesmo julgamento. Engraçado como povos tão diferentes tinham divindades tão parecidas. Os povos são tão iguais e mesmo assim ainda existem guerras no mundo, pura falta de conhecimento! Pura falta de compreensão humana!! Saber que somos frutos da mesma matéria já seria um ponto grandissíssimo na escala evolutiva. Quantos raios ainda terão que atingir as nossas cabeças, para que fuzis sejam apenas peças de decoração de obras artísticas?

Espero que bem poucos. E bem longe da minha cabeça. Sempre a achei muito grande, e uma cabeça grande é sempre muito mais fácil de ser acertada por um Raio. Já ouvi histórias de pessoas que sobreviveram a uma “raiada” no corpo, (porque na cabeça acho meio difícil). Não sei se é pela experiência de quase morte, ou por quase 1 a 40 C de carga elétrica passando calorosamente (e bota mais calor nisso) pelo corpo. Que elas despertam com uma nova identidade de vida. Lembro de ter lido sobre um cara que era tão grosso quanto mal humorado, fazendo com que todas as suas relações de vida acabassem. E depois de um raio ter caído em sua casa (ou no terreno de sua casa, não me lembro muito bem) enquanto ele atendia ao telefone, a descarga elétrica parou seu coração, mas ele sobreviveu sendo atendido por paramédicos (e toda aquela mesma história americana que passa na sessão tarde). Quando ele voltou a si, estava com um temperamento calmo, mas o raio havia mudado sua vida. Assim como tinha quase lhe dado a morte.

O destino é difícil de se entender... Às vezes tira tudo o que você tem, para mostrar o pouquinho que ainda te resta. Se temos sorte sobrevivemos e enxergamos esse pouquinho como algo imenso! Mas se tivermos azar apenas contemplamos de longe com lágrimas no olhos querendo uma chance de fazer de novo. Eu só sei de uma coisa, adoro escrever enquanto o mundo cai em chuva!!! Uma tempestade de primavera sempre acalma o meu espírito e então fecho o caderno e me sento perto do sofá. Leio enquanto sei que a vida corre lá fora gerando energia, colidindo-se em pequenos tufões. Depois volto a ter a mesma noite estranha que falei no principio. Só que essa ainda cheia de raios luminosos em céu noturno.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Bel-prazer



Tem dias que eu queria ter alguém a quem pudesse voltar depois de uma semana desgastante de trabalho forçado... Dias em que eu queria receber um sorriso que pudesse iluminar uma noite.

Sim! Eu queria poder dizer eu te amo deitar em céus azulados e bem aventurar em meio de cabelos longos, olhar mediante de quem espera por você. Quisera eu que alguém pudesse me esperar e me acalantasse no seio. Dançando valsa por toda imensidão clara. Desses bem claros, mãos atadas, lábios correspondidos.... Musa para sonhar. Alguém que pudesse fazer de lua. Que aceitasse o titulo de amada. Quem eu colocaria no pedestal de meu sentimento mais profundo na benção de qualquer fada.

Assim não teria que cantarolar músicas tristes olhando o vidro sujo de um ônibus de última passagem. Não enxergaria casais fatigados por romances, escravizados pelo tempo sendo apenas fruto de bagagem que se deve levar.

Quisera eu poder estocar-me outra vez de amor vivo, latente, transcendente de toda matéria rosa flor.


Quisera eu não ouvir a vulgarização da palavra amor, uso indefinidos de tantos bom dias confundidos com eu te amo, meu amor! Eu queria não ver alianças cor de prata sem significado algum, fincado nos dedos alheios empobrecidos de valor sentimental.

Quisera eu ainda poder acreditar num sentido tão sonhador.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Feito Criança Ao Acordar


As vezes eu fico triste assim como um pingo de sal em algo doce. As vezes tudo não passa de um balde de brinquedos confusos, quebra cabeças com tanques e nave espaciais. As vezes a vida fica sem graça sem ninguém pra brincar de pega-pega. As vezes você sobe para o recreio mas esquece o lanche e o pior é que ninguém quer repartir.
As vezes a tia briga com você e você só queria ir no banheiro por se sentir apertado. Daí você acaba fazendo nas calças, todo mundo te olha e você se sente urinado feito criança perdida no meio da rua.

Sua mãe te bate, seu colega te bate... O mundo inteiro só quer saber de espancar.
E não tem essa de conselho tutelar, ou de carinho na nuca. Todo mundo só inventa de punir dizendo que é coisa de malcriado. Coisa de menino do cão.
Jogam-te chinelos, puxam seu cabelo. Arranham teu braço e te esfolam com a espada de são Jorge.

As vezes você tem cincos anos, as vezes cinco mais três.
E aprende a engolir o choro que nem gente grande... Igualzinho a gente grande....

Crescendo hematomas. Crescendo castelos de areia desmanchados pela onda. Crescendo olhos cristalinos perto mar. Até não restar mais infância.

As vezes é sua namorada ou sua mãe te dando sermão por esquecer as coisas. Ensinam-te uma postura. Mas ninguém pode te ensinar a amar. Ao contrário te ensinam a ser forte a esquecer rápido a parar de ser tão emocional.

Feito criança ao acordar...

Feito criança ao acordar!!!

domingo, 11 de outubro de 2009

Ocasionalmente perto... Propriamente juntos!


Seu nome era de pão francês, desses que vendem frescos na padaria. Possuía cabelos negros e um conceito meio de algodão doce em dia de parque. Seu sobrenome era de profeta judaico, sol nascente de algum lugar afastado. Portador da espada de chamas do Monte Carmelo.

Ele curtia a Kiss FM, gostava de uma Anna e andava pensando no último fim de semana.

Todo dia na mesma sina ele bocejava com seu último nome de poeta português. Escritor de cartas. Três siglas que o denominavam na chamada do médico.

Ele perdera a carteira em cima de um banco. Lamentou o encanto e sempre fora assim, leso demais com esses objetos sem sentido.

Ele ouvia Pink floyd, pois sentia esperança. Tinha paladar aguçado e gostava de misturar canela em algum ensopado. Trazia consigo uma semente no bolso, lembrança daquela primavera que gritava cigarras nos troncos de pau Brasil. Ele se sentia feliz com coisas bobas e triste com coisas difíceis.

Ele andava na rua quando encontrou Ela. Ele ficou abismado, Ela nem notou que Ele existia.

Ela tinha tatuagem de fada, usava óculos escuros e gostava de anarquia. Tinha sobrenome de princesa e dançava Flamenco na Padaria. Tinha pernas robustas e prezava pela vida das árvores. Gostava de pedra Letícia e daquela música triste do Caetano. Ela tinha o coração partido por um tal de João. Ela tinha nome Italiano de beleza iminente. Gostava da essência das rosas e de sereno em manhã fria. Ela gostava de ser beijada no pescoço e de massagens imprevistas na palma da mão. Tinha o último nome de planta antiga.

Ela poderia ter amado Ele, Ele poderia ter gostado dela.
Mas apenas se cruzaram no meio da rua.

Ocasionalmente perto, propriamente juntos. Só precisavam de um bom dia. Ou quem sabe um abraço...

Ele e Ela. Ela e Ele. Fatidicamente desconhecidos.

domingo, 4 de outubro de 2009

Quatro de mim


"Qual é a sua substância, do que você é feito, para que milhares de sombras estranhas recaiam sobre você?"
(William Shakespeare- Sonnet 53)

Eu queria começar esse texto dizendo que o mundo é normal e tantas outras definições abordadas nesses livros idiotas de auto-ajuda. Queria dizer também que Rolling Stones é bem melhor que a maldita tempestade de Beethoven, e que lágrimas são apenas pesares de pouca coisa que a gente teima em deixar prá lá.
O fato é simples, não sofro de nenhum parâmetro de anormalidade conceituado pelo conselho neurológico de psiquiatria! Para ser sincero, eu confio na coerência das coisas normais (ou conceituadas nesse padrão). No entanto o que me aconteceu foi bem diferente de qualquer ponto lógico medido e determinado como realidade. Também não foi algo digno a ser conceituado como sobrenatural.(Deixo isso a cargo dos mitos de fantasmas, bruxas, fadas ou Succubus de decotes altos).O que aconteceu, aconteceu assim: "acontecendo". Foi numa sexta feira de Agosto, mas bem que poderia ter sido numa quinta feira de Outubro, afinal Outubro tem dessas coisas estranhas cosmicamente falando. Contudo tenho certeza que foi num desses dias pesados de Setembro!

Cheguei em casa depois de um dia incessante de trabalho. Minha cabeça latejava e meu corpo pedia súplica de cama forrada e janta na mesa. Não me lembro que horas eram, mas lembro do sentimento que me abordou cruzando os portões da frente... Uma Mistura de fuga do dia com o acolhimento do lar. È meio incoerente dizer, mas sempre que olho o metal desgastado dos portões me sinto um pouco mais acolhido pela vida.
Longe dos muros, perto das pistas, no seio urbano da nação. Com facilidade entrei em casa. Subi as escadas, larguei minha mala cheia de roupas sujas em algum lugar da parede. Tomei um comprimido pra espantar os males de uma dor de cabeça recém chegada. Não me lembro se jantei naquela noite, estava tão cansado que simplesmente abri a porta do quarto e despenquei na cama num único movimento. E nesse instante a dor de cabeça aumentou, e todas aquelas vozes do dia vieram até mim... Vozes de cobrança que ouvi o dia inteiro, no trabalho, no bar, no ponto de ônibus. Vozes de cobrança que gritavam alto dentro da minha cabeça. E o quarto então girou...
— Você é muito torto precisa aprender a dobrar certo essas camisetas!
— Cara! Você fala muito rápido, precisa adquirir dicção vocal.
— Mais ligeiro!
— Mais devagar!
— Você tem que saber esperar!
— Você tem que ser mais rápido!
— Você tem que investir pra cima da sua melhor amiga.
— Você é muito lerdo!
— Olha o tamanho da sua barriga!
— Você é muito sentimental!
— Você tem que saber esquecer.
— Frio!
— Grosso!
— Idiota!
Em questão de segundos as frases consumiam minha mente. Não paravam um só segundo, criavam-me para o mundo. Algumas até me faziam odiar a mim mesmo. O pior que essas geralmente eram sutis:
— Você é uma pessoa maravilhosa! Com certeza merece tudo que há de bom...
— Tem um sorriso maravilhoso também.
— Eu te amo!
— Sempre seja assim...
— Continue assim...
— Meu bem!
— Espero que você tenha sempre esse jeito lindo de ser!
— Quero casar com você, ter filhos!
— Você é especial!
— Ùnico!
Palavras boas que se tornaram ruins com o tempo. Ofuscadas dentro do córtex cerebral em algum lugar pairando num cheiro perdido, numa brisa passageira dentro de uma esquina qualquer. Faziam meus olhos secar mesmo fechados. Ardiam como insônia de duas semanas, passando lentamente a imagem. Palavras que me lembravam cenas. Cenas que produziam imagem e imagens que me faziam não ter sono nenhum.
As vozes internas aumentavam até o ponto que soltei um....

— Ahhhhhh!

Loucura fervia em mim. Mas tudo que escutei como uma suposta resposta ao meu grito fora uma batida seca na porta. Toc! Toc! Toc! A madeira da porta rugia com as batidas desempenhadas. Estranho foi a primeira coisa que passou pelas minhas divagações. De repente as vozes haviam cessado, e eu havia caído da cama como se a gravidade tivesse aumentado dez vezes o meu peso. Minha face permanecia contra azulejo frio no chão. Levantei bem devagar e destranquei a porta... Quando puxei a maçaneta percebi que realmente alguém estava ali. Enxerguei uma pessoa, no entanto, talvez pela junção da tontura e das luzes que estavam desligadas, de inicio não distingui nada além de um vulto embaçado!

—Você não vai me convidar para entrar?

O mais estranho é que mesmo surtado eu reconhecia aquela voz. Parecia puramente familiar e altamente cotidiana.
— Não é muito educado deixar alguém tão próximo de fora...
— Próximo de que?Quem diabos é você?
E novamente escutei aquele estranho vulto dizer no mesmo tom que me era familiar:
— Eu sou você!
De repente a luz havia acendido. Jogando claridade em meus olhos, a imagem então apareceu bem nítida. Era certo que eu via um espelho vivo! Um espelho de carne movimentando-se em exterioridades faciais. "Idêntico a mim!". Pensei analisando aquela face. Depois de olhar bem percebi com algumas mudanças. Naquele dia eu estava de calça jeans e uma camiseta branca sem estampa. E aquela estranha figura vestia um terno azul escuro típico de executivos de rua. Tinha feição viva e menos desgastada que a minha. O que me causou aquele amedrontamento instantâneo, não era a aparição em si, mas o fato daquela reprodução carnal estar de terno! Ternos sempre me trouxeram pesadelos.
— Posso me sentar?
Perguntou a versão estranha num tom cortês, enquanto eu permanecia imóvel, medindo em que grau de esquizofrenia me encontrava naquele momento. Depois de alguns minutos em silêncio, voltei a "realidade" e simplesmente disse:
—Que merda é você? (As únicas palavras possíveis que saíram de minha boca, no entanto averiguando agora, muito propicias para aquele momento).
— Eu não sou um pedaço fétido de restos de comida digerida! Onde estão os outros?
— Que outros?
— Aqueles que virão para reunião...
— Reunião?
— Pelos deuses de alguma religião politeísta! Pare de se fazer de tonto! Posso me sentar nessa cadeira?
Insistiu a estranha figura empurrando uma das cadeiras que permanecia no centro do quarto. Tinha um olhar bem focado, daqueles de gerente de banco meio calculista bem compenetrado. Andava perfeitamente com os ombros elevados.
Não sei se foi o amedrontamento por me ver de terno oscilando pelo quarto. Ou pela situação em si. Mas quando olhei cadeira sendo puxada no chão por aquele clone esquisito só tive uma reação!!! Belisquei meu próprio braço tentando acordar!
"Acorde! Acorde! Acorde!" Pensava comigo oscilando os beliscos quando escutei gritos guturais vindo da figura estranha:
— Ou! !!!!!!Isso dói! Pare já com isso!!! Quer me machucar?
Eu queria chorar, gritar... Pedir socorro! Aquilo realmente estava acontecendo?Ele sentia minhas dores. Podia notar sua pele levantar com os beliscões. De todas as coisas estranhas que me aconteceu nessa existência mundana, aquilo certamente superava em grau e circunstancia(e olha que eu nem havia ingerido tequila).
— Acalme-se! Assim você vai acabar assustando os outros! Principalmente, O Terceiro! Pelo que ouvi falar, ele é mais medroso que o próprio sentido de ter medo. Bem! Acho que você não vai ligar se eu continuar sentado aqui não é? Está tão ocupado tremendo, ai mesmo! Poderia me oferecer algo para beber...
— Terceiro? Como assim? Droga! Meu deus! Você é algum tipo de irmão gêmeo perdido?
Cessei seu pedido. Tentava achar algum ponto lógico que explicasse minha insanidade presente.
— Não! Não sou o teu irmão, apesar de eu também ter o mesmo sangue. Eu sou parte de você! Aquele que oferece as primeiras apresentações, que discursa nos seminários. A voz cativante que enlouquece o coração das mulheres quando você moraliza amor. A fala imposta num debate, quando você não gagueja é claro! Sou sua lábia de convencimento... O porte de vendedor. O mais educado dos quatros que virão. Sou "O Arauto"! "—Muito prazer meu caro! Agora se você não se importar, será que não tem um copo de chá para oferecer a sua primeira visita?
O que aquele cara estava falando...Parte de mim? Chá? Haveria alguma coisa na água que tomei pela manhã que pudesse causar uma alucinação tão grande? Interrogações cobriam o meu corpo. Num movimento instintivo puxei o cobertor. Sentia-me indefeso! Por ver me assim: Tão perto de mim mesmo.
— Eu estou louco, certo? Pirei na batatinha? To conversando com fantasmas de face própria...
— Acalme-se! Juro, não queria que fosse eu o primeiro a vir até aqui e abrir a pauta de apresentação. Mas os três quiseram assim. Engraçado você me olhar como se eu fosse uma assombração...
— E o que você quer que eu ache! Estou me vendo num terno azul.... E pior, estou me ouvindo num terno azul. Se você não é uma assombração, então eu preciso urgentemente de remédios de tarja preta!
— Olha! Você precisa de um copo de chá! Eu preciso de um copo de chá! Portanto alguém tem que ir preparar chá... Já volto!
Ele saiu do quarto... Enquanto eu puxava outra coberta numa tentativa de me sentir mais protegido. Escutei o barulho das louças na cozinha. Ele realmente estava ali presente, dentro da minha casa. Uma alucinação preparando chá. Seria alienado demais para não me fazer falar sozinho.
A porta se fechou de novo. Um barulho de batida ecoou na cabeceira da cama. Eu havia fechado os olhos. Quando não ouvi mais nada. Algo caiu em cima de mim! A cama veio ao chão num barulho típico de madeiras e ferros se destroçando. Por algum ato instintivo pulei fora da cama que naquele momento parecia uma linha de fogo vietnamita. Gritei o mais alto que pude. Gritei levando todo ar que restava no meu pulmão. E tudo que tive como resposta foi um:
— Ops! foi mal!
Fiquei em silêncio novamente, observando um corpo se levantar dos restos do que um dia havia sido minha cama. Em meio à poeira e um amontoado de cobertores surrados. Erguia-se um sujeito bizarro. Ele Apresentava roupas idênticas as minhas, com uma única exceção. As roupas dele estavam evidentemente muito amassadas e sujas de poeira.
— Idiota! Você me assustou, olha o que você fez.—Disse apontando para os destroços — Quebrou a cama!
Estava tão irado naquele momento que nem me importei para o fato de me ver outra vez perambulando no quarto. Bastava, já era demais! Minhas loucuras agora haviam acabado com a cama. O que viria depois? A casa desmoronando?
— Me desculpe queria dizer um olá! Sabe... Mas então a cama caiu! Juro, eu só queria parecer agradável!
Ele era diferente do arauto. Tinha um olhar sincero e divagava admirando o chão. Sua face tinha certas diferenças, além de ser mais jovial (talvez dois anos a menos que a minha idade atual) não tinha barba e usava cabelos despenteados em fios grandes. Mesmo com tantas diferenças sua face correspondia a minha em grau genético (ou algo assim).
È engraçado, mas naquele momento senti pena dele. O olhar amedrontado depois do grito, o modo como fugia do meu olhar de apontamento. Eu não sabia, mas começava a me reconhecer na face deles. E assim ia mergulhando cada vez mais na minha própria loucura.
— Quem dos quatro você é?
Perguntei já crente de meus espectros de carne.
– Eu acho que eu sou o segundo... Na verdade era para eu ser o primeiro, mas me atrasei! Daí fiquei sendo o segundo mesmo! Não gosto de me atrasar, mas por algum motivo sempre me atraso–Ele repetia as frases observando diversos pontos no teto até a parede—Você está bem? Digo! Ainda está nervoso por causa da cama? Eu posso tentar arrumar...
Ele se ajoelhou e levantou parte da carcaça da cama (aquilo feito de madeira que fica em baixo dos colchões que eu nunca me lembro o nome) e num ato desajustado tropeçou e despencou com as madeiras quebradas em cima da minha estante de livros. A estante cedeu abaixo com os livros tombando em sem sua cabeça;
— Ops!
A única linguagem que soltou depois receber uma segunda edição em capa dura de Dom casmurro na nuca.
— Ahhhhh! O que você é afinal? Minha parte idiota?
Zanguei-me não acreditando num segundo ato tão azarado quanto o primeiro. Era possível repetir o grau de azar num movimento secundário?
— Foi sem querer! A cama era mais pesada do que eu pressentia. Eu posso tentar arrumar de novo?
— Nããão!!!!!!!!!!!!! Fique longe dos moveis. Sente-se ali... Vocês todos aguardam uma reunião não é?
Agucei mudando de assunto, tentando persuadi-lo a ficar quieto e não quebrar mais nada.
— Reunião?Ah, é mesmo! Vamos ter uma reunião hoje! Onde estão os outros?
— Eu estou aqui! —Disse o arauto, aparecendo inesperadamente perto da porta com duas xícaras de chá na mão. —Eu queria hortelã, mas só tinha esse negócio verde...
— Eu gosto de chá ! Posso beber?
— Eu acho melhor ...
Quando o arauto ia terminar a frase, o ser estranho foi trotando como uma vaca desembestada para cima das xícaras de chá. O arauto vendo o grande trote tentou gritar, só que a ação foi tão rápida que pareceu até expressão daqueles filmes de "stop motion".
N Ã Ã Ã O !!!!!!...... Dizia o arauto, enquanto segundo foi com as mãos quase apertando mentalmente a xícara de chá quando se embaralhou nos próprios passos e caiu esbarrando nos braços do arauto que deixou as xícaras despencar no chão. Uma poça de chá verde emoldurou o piso.
Fiquei inconformado como aquela representação de mim. Em todo ato, ou em qualquer tipo de movimento até o mais breve, o resultado era só um : Algum desastre.
Então sem querer o reconheci em mim.
— Você é a minha parte desajeitada?
Parado no chão olhando atentamente para poça de chá. Depois de alguns segundos ele começou a falar:
— Havia um homem torto. Sentava em suas cadeiras tortas, vivendo sua vida torta. Tinha um amor torto. E um a cachorra torta. Comia em talheres tortos. Dobrava suas roupas tortas, escrevia em sua caligrafia torta: O homem torto no seu mundo torto, por toda vida torta.
Não disse nada, pois compreendia cada pedaço daquelas palavras. Por mais engraçado que fosse para outros aquela parte de mim, não passava de uma face abatida. Tinha uma caricatura boba de clown perdido, tentando se adaptar a sociedade que o renegava por ser desajeitado. Tentando fazer certo, quando tudo correspondia a uma ação perna-de-pau. Os apontamentos dos outros sempre foram algo que me tiravam a comédia desses personagens sem jeito. Todo clown tem
uma lágrima no rosto. E quase ninguém nota quando ele implode em tombo.
Pedaços da minha vida torta refletia nele.
— Eu sou sua parte que invariavelmente arranca risos.—Aguçou ele outra vez— Sou sua cara suja de pancake*, seu sorriso vermelho. Os pés tortos de vagabundo*. Faço parte do seu olhar de desconforto quando tropeça o pé pelas quinas da vida. Seu sorriso inocente quando se choca com a maldade alheia. A parte embaraçada que causa borboletas no estomago quando toma os primeiros passos para cobiçar uma donzela. Sou seu papel cômico! Sua dança incoerente. O bom humor que mesmo escondido fervilha num sorriso de bem estar. Sou sua taxa de incompreensão dos outros. Seu pedaço de caos minúsculo. Sou o segundo! Pode me chamar de "bocó", claro se você quiser?
(*Vagabundo: personagem criado por Charlies Chaplin cujo uma das representações era os pés tortos. *Pancake: Maquiagem artística que deixa a cara branca)
— Muito Bem! Eu entendo que você tenha que se apresentar... Mas precisava derrubar as únicas canecas de chá???????????????
Gritou o arauto certamente ofendido pelo chá derramado.
— Pode deixar que eu limpo...
— Não Precisa!!
Pronunciamos juntos sem querer.
— Tá! Tudo bem... Não queria mesmo!
— Por favor, fique imóvel naquela cadeira —apontei para a cadeira que estava no centro do quarto— Pode se sentar ali...
— Eu entendo que eu deva me sentar, mas não entendi o imóvel?
— Ele é assim mesmo, nunca entende nada! Seu incoerente é claro que ele disse isso pra você não acabar com o resto do quarto! Não é isso mesmo?
Respondeu por mim o arauto.
— Não é bem assim... —respondi enquanto limpava a poça de chá verde com uma fronha da cama quebrada—Se vamos ter uma reunião, que seja decente! Reuniões em pé são de banda de rock ou de mendigos que se esquentam em fogueiras de latão de lixo. Eu odeio tudo que é formal—Quando disse formal o arauto olhou pra mim com uma careta que defini como "Ou ta me desprezando poxa."—Mas finalizando, acho que devemos fazer uma reunião formal—Nesse momento ele assentia com a cabeça como se dissesse, "Isso mesmo, muito bem!". —E por isso acho que devemos cada um ficar num canto sentados e sem causar mal a nenhum de nos e conseqüentemente ao quarto.
— Apoiado!—Gritou o arauto!—Esse sou eu! Discursou bem demais.
— Você notou a postura torta dele? Duvido que foi você! Essa postura torta é minha!
Revidou o bocó
— Claro que não!
— Claro que é!
— Ele não estava torto!
— Claro que estava!
E foi assim que minhas loucuras de espelho começaram a discutir. Não me lembro quantas vezes eu disse para que parassem, para que cessassem, para que definitivamente ficassem quietos! Mas no fim tive soltar mesmo um :
— Calem a boca!!!!!!!!!!
E então eles ficaram em silêncio.
— Eu tenho personalidade própria. Não sou nenhum de vocês, posso ter postura enquanto falo e entortar os pés em seguida... Mas isso não quer dizer que esteja assumindo personalidades diferentes. Eu sou que sou e não preciso de vocês... Já me custou uma cama, uma estante de livros e duas xícaras de chá!
— Na verdade foi uma...
Interferiu o bocó! Ainda desviando o olhar.
— Não importa!—Disse já enfurecido—Sumam do meu quarto e esqueçam esse negocio de reunião. Não quero saber mais de mim!
— Na verdade, você nunca quis saber! Deixou você mesmo e como conseqüência deixou cada um de nos. Abandonar a si mesmo... Como alguém pode ser capaz de fazer isso?
Aquela voz não veio de mim, nem das duas personalidades que enchiam minha paciência... Diferente dos outros dois, ele não me olhava nos olhos. E estava de costas no centro do quarto.
— Eu não sei do que você está falando!
Rebati a personalidade desconhecida.
— Vou ser breve, pois não cabe a mim esse julgamento. Você nos abandonou abandonando a si mesmo. Nos deixou na noite fria, sem nenhum terço de volta. Naquela tarde você deixou de ter fome, e assim muitos de nos tivemos ânsia por almoço. Passando necessidade, sentindo ressentimento dessa vida que não vale muita coisa. Eu não queria estar aqui dizendo isso! Eu nem se queria falar com você! Na verdade, não importa o que eu diga. Não importa o que aconteça nessa reunião, nada vai mudar. Porque nada muda mesmo!
Eu notei que ele atraia o escuro e quase não se movimentava. Dizia cada palavra como se fosse uma lágrima travada na garganta. Não o senti se aproximando, porque ele já estava ali. Veio com o silêncio melancólico do bocó. Brotou da tristeza ali composta no quarto. De roupas pretas e um olhar dilatado em pessimismo.
— Você é quem?
Indaguei com curiosidade. Queria saber como aquela parte de mim se denominava.
— O que vale um nome ? Vai ser apenas mais uma palavra conceituando algo que não existe. Não sou agradável para ficar me apresentando!
— Então por que veio?
— Já disse, não foi escolha minha. Querendo ou não sou parte de você e por isso fui forçado a aparecer.
— O pessimista!
Agucei com se a resposta viesse rápido na minha mente. Eu notei que conhecia minhas aberrações desde o inicio. Afinal elas eram partes minhas. Viam de dentro de cada ato que me transcrevia como um individuo. A única coisa que eu questionava ainda era uma só! Por que diabos conseguia invocar minhas personalidades em carne e não a Audrey Hepburn cantando moon river de camisola (de preferência aquelas bem transparentes) seria um sonho, mas não! Um louco só tem a loucura que lhe convém.
— Pode me chamar assim se quiser. Mas vou te dizer, não sou pessimista! Sou realista... Pois o mundo é péssimo as pessoas que são tapadas demais para conceberem essa verdade. Na verdade eu não as culpo de não enxergar as beiras no meio da rua, pode ser um choque a felicidade! Quando uma pessoa morre o drama é intenso, Mas quando milhares morrem o drama não passa de um segundo. O individualismo é tão individual que só derramamos lágrimas quando a morte invade nosso mundo. Mas quando isso é exterior todo mundo só reza um terço de boa sorte.
— Tudo bem, se é assim! O nomeio de taciturno invés de O pessimista... Todos apóiam o nome do companheiro de preto?
— Apoiado e muito bem eleito!
Respondeu o orador como se aquilo fosse um juramento a pátria.
— Como que é mesmo o seu nome?
Perguntou o bocó para o taciturno que o ignorou assumindo completamente o silêncio.
— Decidido! Você é a minha parte taciturna.
Eu fugia daquela parte sempre que podia. E naquela vez frente a frente com que me fazia ter olhos caídos não foi diferente. Fugi da minha paixão perdida de Camões. Fugi do meu peito abatido de Lord Biron. Fugi dos meus versos íntimos de Alam Poe. Fechei meus olhos de novo para o meu destino de Azevedo.
— Você não se lembra—Disse ele interrompendo minha fuga e continuou — mas estou com você antes de todos esses heróis do romantismo. Antes que você pudesse compor um verso triste. Ou pudesse causar o choro irrompendo os ventrículos de um coração ausente. Quando você acompanhava sua mãe na fila do banco eu estava lá interligado naquele sentimento que você absorvia das velhinhas da fila dos aposentados. Um frio existencial e um aperto no peito, lembra? Não podia explicar o que era aquilo, afinal você não conhecia a tristeza... Nem sabia como proferir a palavra.
Foi tão súbito ouvir aquilo. Como podemos esquecer de momentos da infância.?Desde que comecei a andar minha mãe me levava junto ela para poder receber a aposentadoria de minha Vó. Por ela ser analfabeto e bem velhinha não conseguia apegar ônibus, daí o fato de todos os dias quinze minha mãe ir buscar seu pagamento. E lá eu ficava exposto aos velhinhos que cruzavam o corredor do banco. Minha alma chorava por eles. Tinha afeto roubado, vulneráveis em rugas... Eles, abandonados pela vida... Sentiam saudade da jovialidade. E eu sentia isso. Sentia porque sempre senti as coisas, isso me tornou Atlas. Sentir o que o mundo me entregava nas costas.
— Eu sou taciturno porque você é taciturno!
Ele cortou minha nostalgia me entregando na cara minha característica mais assombrosa. E continuou.
— Fui parte das tuas lágrimas de amor. O modo escasso como sentia o ar pesado na barriga. Fui todos os perdões perdidos. Todas as tuas canções de chuva. Fui teus olhos quando a janela do ônibus disse o único adeus dito em silêncio. Fui tua descrença poética quando enxergou tudo perdido na ponta da escada. Quando seus olhos prendem e desviam a feição sou eu. Quando tuas palavras reagem com pessimismo de uma lente social desajustada é minha voz. E quando a agonia dilacerar teu peito novamente e a única coisa que se reste for um perambulo de velório. Serei eu nas tuas palavras. Chame- de taciturno... Ou de pessimista, mas tenha em mente que sou a maior parte que transcende dentro de você.
Quando ele terminou notei que os outros derramavam lágrimas, pois como parte de mim sentiam o ar nostálgico. A lembrança sempre tem um resíduo de melancolia. Reparei nos outros dois, reparei como choravam. O orador tinha um choro tímido, derramava lágrimas sozinhas e logo limpava com medo de que alguém o observasse chorando. O bocó pelo contrário tinha um choro de criança uma feição de berro infantil alternando lágrimas longas, não ligava por chorar em público. Já o taciturno era diferente tinha os olhos vermelhos mais sem lágrimas. Abreviava uma feição que comoveria até o ser mais frio existente. Foi inevitável, mas o silêncio havia voltado. Ao contrário deles eu não tinha fluido para chorar, de alguma forma eu havia me acostumado com a nostalgia e como conseqüência criado um anticorpo para essas tristezas de choro.
— Caras! Escutem, vocês são muito sentimentais.
Interrompi o silêncio que parecia fúnebre.
— Eu concordo plenamente!
Disse o orador tentando esconder o resíduo das lágrimas limpando com a manga do terno. O bocó tentou dizer algo, mas soluçava demais tentando restabelecer o controle sobre os sentimentos desencadeados. E o taciturno, ainda residia no silêncio que ele mesmo havia criado.
— Muito bem! Vocês estão aqui, já se apresentaram! Já choraram e destruíam meus moveis... Agora me digam por que ainda não começamos essa maldita reunião que vocês sempre comentam?
— Falta um de nós...
Rebateu o bocó ainda com a voz meio abatida.
— Sim! O último de nós!
Afirmou o arauto
— Ele!!!!!!!!!!
Apontou o taciturno para a porta
—Ele?—Perguntei virando o rosto para direção descrita pelo taciturno quando minha expressão poderia ser transcrita como: "Caraca véio que porra é essa?"
— Eu já esperava expressões idiotas vindas de você!
Nenhum dos três me causou mais espanto do que o quarto. Usava uma roupa estranha parecida com que os formandos usam. Representava minha feição mais difícil e que somente os que não tiveram muita sorte (ou me irritavam muito) haviam presenciado.
Feição interrupta, sem curvas ou sinais de fuga. Ele caminhou em passos firmes e se situou no meio do quarto, depois que o taciturno cedeu-lhe o lugar,e sem mais começou a dizer.
— Então está tudo pronto?—Os outros assentiram com a cabeça. —Então podemos começar...
—A Reunião?
Perguntei sentindo um frio na espinha por estar diante daquela situação.
— Não!
Replicou ele
— Então o que?
Perguntei de novo
— O Julgamento!
Pela primeira vez naquele dia suei frio. Não pelo espanto de conversar com minhas personalidades. Mas com a possibilidade delas me julgarem.
— Como assim Julgamento? Quem você pensa que é? Você chega e nem se apresenta e fica dizendo essas merdas de julgamento... E vocês dois por que olham pra ele como se ele fosse um chefe em área de trabalho?
— Ele é o juiz! Ele despensa apresentação...
Disse o bocó
— Nós o respeitamos, pois ele representa o nosso respeito, ao contrário estaríamos desrespeitando nos mesmos!
E terminou o arauto. É incrível como podemos nos sentir sozinho mesmo estando conosco quatro vezes. Em quatro faces diferentes.
— Quietos!
Impôs o Juiz.
— Agora o que for dito pode cair como sentença para qualquer um aqui, inclusive eu! Você deve estar se perguntando por que estamos aqui?
— Não! Na verdade é até menos solitário enxergar quatro seres iguais a mim falando traços do que eu sou.
Ironizei a pergunta idiota, era obvio que eu havia perguntado isso sem parar.
Com um olhar aterrorizante ele apenas expôs:
— Não gaste as tuas palavras com ironias de mau agrado. Isso não irá diminuir os teus atos diante o Juri!
— Isso!
— Não mesmo!
— Nenhum sentimento te absolverá agora!
Disseram os outros. A única dúvida que me veio em mente foi: essa é a parte que eu corro?Entretanto quando minhas pernas firmaram e os passos de corrida estavam prontos para o percurso meus joelhos foram levados ao chão e então fiquei imóvel outra vez.
— Onde eu estou?
Desesperei-me vendo um fundo branco, como se o infinito ocupa-se meu quarto—Onde eu estou? repeti gritando.
— O melhor tribunal que existe é esse que reside em nós mesmos!
— A pior crítica é aquele aponta os próprios atos!
— Não importa quantas pessoas sofram por você, o verdadeiro sofrimento é aquele que aglomera dentro de você mesmo!
— O que te deixa sem jeito quando tropeça na rua, não são os risos alheios, mas o incomodo de fazer tudo errado!
As vozes falavam comigo. Quatro pontos diferentes de um mesmo diálogo.
Naquele instante eu não os enxerguei mais como indivíduos de um nome só. Eles agrupavam em volta de mim como faces de satélite natural, atraídos por mim. Envolta de mim giravam e giravam apontando o significado de tudo aquilo. Eu tive de compreender da pior forma ali exposto no meu interior branco.
— Por que me detestam tanto?
Gritei dentro de mim com um realce de pânico involuntário.
— A pior pessoa no mundo não é aquela que abandona os pais num asilo, ou o grande amor sem súplicas de perdão. A pior pessoa é aquela que abandona si mesmo!
— Do que você estão falando? Eu nunca abandonei a mim mesmo! Seja isso o que quer dizer.
— Nunca?
— Jamais?
— Nem por hipótese?
— È o que você realmente afirma?
Quatro hipóteses de dúvidas que me feriam.
A face tornava maior na medida que as vozes eram ditas. Era imenso como um deus de cara. Conhecia todos meus medos. Sabia todas as minhas datas de aniversário e perguntava cada um em seu campo habitual. Eram os quatro em sua reunião, a pauta era eu mesmo.
Tinha que me defender ali ,se não a sentença seria loucura para todo sempre. Se fosse acusado sofreria de crises bipolares por toda a vida, quem podia afirmar qual seria veredicto final?
— Digam vocês quando os abandonei então?
Disse tentando achar uma forma de defesa.
— Todas as horas martirizadas pelo os outros!
—Todas as vezes que nunca ouviu o que tínhamos a dizer, mergulhou em palavras sem sentido. Agiu de atos que nunca foram realmente teus.
— Quando Vendeu os teus sonhos por tristeza! Trocou sua imaginação por atitudes que nunca definiram você!
Então em coro todos disseram em uma só vez:
— Quando ela fugiu de você!
Certas coisas não podem ser ditas. Não podem porque voltam contra você!
Coisas são esses sentimentos que não dão certo.
Eu odiava que falassem dela. Droga! Odiava quando o assunto caia naquele termo... Ela!
Quatro coisas que me lembravam ela.
— Eu não quero falar sobre isso!
— Então você assume a culpa?
— Culpa pelo o que?
— Pela perda do bem mais precioso que teve em sua vida!
— Vai pro inferno!
Meu coração queimava queria ver todos destruídos, mesmo que o preço fosse destruir a mim mesmo. Tentava de todas as formas me livrar daquilo, mas meus músculos também haviam me abandonado.
— Você sonegou teus sentimentos mais profundos mandando ela embora!
— Ela foi embora porque quis! Nunca pedi pra que partisse, e mesmo assim ela partiu! E Partiu junto com meu coração!
O universo branco girou e logo me vi no meio de uma mesa redonda. O arauto falava enquanto os outros permaneciam sentados.
— Você tropeçou na queda inevitável... Você sequer persuadiu ela a ficar! A reunião está aqui, um de nós irá te assumir. Estamos Cansados de passar fome!
— Sim!
Gritavam os três batendo na mesa.
— Cansamos de engolir palavrões e não mostrar a cara...
— Sim!
— Cansamos de perda da vida, do amor e da compreensão... Cansamos de nos sentir fracos e desajustados pelo medo de agir...
— Sim!
— Por isso eu assumo o cargo de personalidade imponente e única a decidir a vida de todos nós!
Os três então ficaram em silêncio, enquanto o arauto fingiu ser aplaudido. Quando o Juiz levantou e disse:
— Basta! Como pode se julgar o pleno da mesa? Como pode julgar algo se não fui eu quem o julgou? Eu me julgo habito a exercer o cargo!
—Você não é o dono da verdade, mesmo que as vezes pense que seja! Seu julgamento presunçoso irá nos matar! Não pode assumir o cargo.
— Eu eu?—Levantou o bocó. E disse gaguejando por estar nervoso—Eu acho que poderia...
Quando ele ainda estava falando os outros logo cortaram em uníssono.
—Não!!!!!!!!!!!!
— Seu modo desajeitado vai fazer com que as pessoas nos matem! Portanto também não pode exercer o cargo—Argumentou o arauto e logo continuou—Vedes sou o mais indicado ao cargo, tenho boa aparência! Tenho uma boa dicção, e consigo influenciar pessoas...
— Seu convencimento de si mesmo vai nos causar câncer! Você trata pessoas como cálculos inúteis. Tem muita razão e pouca sensibilidade. O máximo que vamos conseguir com você é status de frieza social. Para a nossa saúde moral, você é o menos indicado ao cargo.
Reagiu o taciturno e quando parecia que ele iria continuar, simplesmente ficou calado.
— Por que não se candidata?
Disseram os outros três.
— Porque eu sei que se fosse nomeado, eu cortaria os nossos pulsos!
A discussão aumentou numa maneira em que nenhum dos argumentos eram entendidos por completo. Uma gritaria de vozes dispersas que entravam no meu ouvido naquela noite. Eu pensei em mim naquele momento. Em que fui, Em que sou! E no que estava me tornando. Então simplesmente submerso em mim mesmo roubei a voz dizendo:
— O que faz a gente ter reações diversas sendo o que é? Juro que não sabia explicar até ouvir vocês falando hoje... Quando vi vocês em olho cru! Às vezes você deixa de ser o que pensou que era... Assumindo uma face que sempre esteve ali, mas nunca notou que existia.
O sábio, o elegante, o estranho, o desajeitado. Não importa como vocês se rotulem, todos não deixam de ser uma parte de mim. Desculpe se feri a mim mesmo evitando ver cada um em minha face. Desculpe se meu amor não dito criou sequelas no peito de cada um de vocês!
Quando chorei pela primeira vez um de vocês assumiu o jogo, quando me irritei com o mundo outro de vocês tomava as dores. Somos única parte de uma coisa só! Sentimos o mesmo medo, temos a mesma ânsia de carinho. E por isso peço imensamente que encerrem essa discussão e elejam todos!
— È impossível somente um pode habitar em personalidade única!
Assegurou o Juiz.
Foi então que ocorreu uma saída, algo que só eu podia exercer.
— Então me elejam.—Disse já conseguindo me mover outra vez— E assim poderão me habitar e cada um terá seu espaço num determinada ação. E cada um terá um único nome e jamais deixarei que se anulem enquanto eu viver. Elejam-me e tomem conta de si mesmos e como conseqüência um do outro. Pois seremos o interior da mesma essência. E assim novamente uma só personalidade!
Quatro essências que eu mesmo possuí.
A exceção a regra do Juiz era isso. Nenhum deles podiam coexistir me assumindo. Mas eu poderia assumir os fazendo coexistir. Era a decisão mais lógica a ser tomada.
— Eu poderia Julgar as decisões que não dão certo?
Perguntou o Juiz..
— Claro! Desde que não seja bruto nos julgamentos de nossos atos. Pois todos nós compartilharemos da mesma sentença e temos o direito de pagar esse débito.
Respondi não sabendo de onde havia tanta calma em minhas palavras.
— Então eu estou de acordo!
O juiz simplesmente desapareceu da mesa. Foi sumindo criando uma visão critica dentro de mim. Notei que precisava de óculos ali.
— Eu poderia rir com as pessoas quando fizesse algo destrambelhado?
Questionou o bocó.
— Desde que seu riso seja algo verdadeiro e você não ligue para os deboches alheios... Claro! Seria ótimo rir de nossas idiotices.
Averiguei compreendendo que esse era o seu, (digo), o nosso maior desafio.
Foi então que vi o bocó partir. Senti uma felicidade sutil. Aquela das coisas que são simples. De nascente de água e refresco em dia quente.
— Eu poderia falar em publico e expor as nossas opiniões?
Indagou o arauto.
— E porque não? Dizer o que pensa é algo que sempre nos fez melhor!
Sorri sabendo o quanto era bom falar.
—Tem só mais uma coisa...
Continuou ele
— Diga?
— Podemos fazer tudo isso de terno?
— Se a ocasião pedir, porque não! Afinal ternos não são tão ruins assim.
Tá eu menti! Maas eu tinha que dizer algo de bom sobre os ternos. Então vi o arauto ir embora sem xícaras de chá dessa vez.
Só faltava um e este olhava diretamente pra mim e não disse nada. Esperei que ele inicia-se um dialogo como os outros fizeram.
— Então?
Tentei puxar assunto, mas ele ainda olhava sem dizer uma única silaba.
— Você discorda do que eu disse?
— Não! Você disse aquilo que todos queríamos ouvir. Simplesmente queríamos ser notados, essa é verdade! È engraçado, mas a maioria das pessoas passam milhares de horas e não sabem do que são feitos. Renegam o berço conveniente da própria alma. Você superou nossas expectativas, conseguiu entender a si mesmo. Por isso não tenho nada mais a dizer!
— Você não vem?
Apontei na direção do meu peito. Esperava que ele se juntasse aos outros.
— Vocês não precisam de mim! Eu causei os nossos medos até agora, culpei você... Mas devo ter um parcela de culpa, afinal ela nos abandonou pelo meu pessimismo. Eu não quero causar mal nenhum. Não quero causar lágrimas e dissoluções de perda. Eu fico aqui e vocês podem ir!
Eu podia ter aceitado aquela decisão dele. Podia ter vivido feliz sem meus demônios de solidão. Mas quem é verdadeiro se não senti uma única vez tristeza? E assim disse tentando persuadi-lo a ir com outros.
— Eu entendo o que você diz, mas existe felicidade que não passa? De uma forma ou de outra decepções sempre irão existir. Lágrimas são apenas um lembrete para que possamos limpar o rosto e seguir em frente. Sua tristeza e pessimismo foram importante para gerar afabilidade e destilar coisas boas do escuro. Não importa quanta escuridão exista, uma fresta de luz sempre abrirá o caminho! A melancolia é necessário para evoluirmos, somente os que sofrem em crises existenciais, amorosas ou por perder o queijo numa manhã qualquer, sabe o significado de ter otimismo na vida! Você é necessário para gerar vida em nós, se ficar aqui não há equilíbrio e sem equilíbrio não haverá vida! Venha, junte-se a nós!
Não sei se foi por prazo determinado, ou pelo meu argumento sutil, mas quando olhei para o taciturno. Não vi mais aquele olhos tristes ou aquela face caída... Ele sorria, num sorriso tímido e peculiar e quando menos notei havia sumido. Todos eles haviam sumido! Não havia mais as mesas e a imensidão branca estava pintado nas cores habituais de meu quarto. Verde desgastado uma cama intacta onde eu me encontrava suado de respingar no lençol.
Todos eles haviam desaparecido e sequer eu tinha fechado os olhos!
Olhei o relógio e já constava quatro da manhã!
Quatro sonos que perdi. Quatros sentidos que voltei a aprender.
Quem sabe não foi um delírio de febre alta! Uma visão do fim dos tempos ou paranóia de ficar tanto tempo lendo histórias sem sentido.
O sonho havia terminado, as aves iriam cantar no dia seguinte e o ônibus me esperava. Despenquei na cama de novo, mas demorei para pegar no sono, mas quando dormi foi como se a vida fosse composta de paz. Não continha vozes exteriores dentro dos meus ouvidos. Não Havia vozes de lembranças adoecidas que me traziam de volta aquele tempo ruim.
Minhas vozes interiores zelavam por meus sonhos.
A gente sempre sonha o que quer quando está com o interior unificado.
Eu não procurei terapia depois daquela noite, não tive medo de estar louco... Afinal encontrar quatro personalidades na porta do quarto é um bom motivo para acreditar que a loucura pode ser adquirida numa noite qualquer!(Não acha?).
Eu deixei que a rotina do dia seguinte me levasse a esquecer aquele delírio. No entanto, algumas vezes quando passava por um carro parado ou por uma vitrine com vidros limpos, e enxergava meu reflexo... Conseguia notá-los!
Eles viam devido as minhas vestes ou por esses sentimentos que nos absorve em cada travessa escura. Permaneciam ali dentro dos meus olhos. Não diziam nada sequer se mexiam, apenas ficavam em refugio do lado oposto do espelho. Traziam a lembrança que às vezes o que nos dizem não vale a pena de ser guardado, mas o que você mesmo diz é permanecido na alma. Podendo se transformar em argumento, cria ossos e um dia te visita no meio do quarto querendo explicações da falta de senso consigo mesmo! E quando você menos percebe está agindo diferente, tomado por força interior. Sendo grosseiro, chorando por motivos que nem conhece. Se perdendo até não restar mais nada de você!
Aqui está um lembrete: Pode ser uma personalidade irada. O teu interior enfezado , abolido e devidamente ofuscado por você mesmo!
Conhece-te a ti mesmo, caso o contrário a ti mesmo irá conhecer quatro vezes.

domingo, 13 de setembro de 2009

Sobre presentes e cláusulas.


Sinto como se o mundo parasse diante meus olhos. O céu vive em azul claro, as nuvens oscilam como mancha da tela natural do grande universo. Cada traço presente na atmosfera faz parte do meu presente. Cada detalhe no alto das montanhas, cada gota presente de tinta viva faz parte do meu quadro.
O primeiro presente que recebi veio sem caixa ou fita adesiva.

Tinha detalhes estranhos e um brilho intenso. Veio bem antes de eu saber qualquer definição de presente. Ele me foi dado por um desconhecido, entregue de mão limpa numa sala de operação. A primeira coisa que fiz foi chorar. E ali tive meu primeiro contato com as funções que haviam em meu presente. As cores eram muito fortes no principio e som que tudo aquilo imitia era confuso demais para os meus ouvidos. Sem saber como desfrutar do presente apenas o embrulhei em mim e fechei os olhos. Ali descobri mais uma coisa nova sobre aquele presente, era aconchegante mesmo se sentindo inseguro.

Com tempo aprendi que meu presente era notável, cheio de perspectivas que ainda sim me cativavam dia após dia. Era interminável dividido em horas que me traziam o despertar de vários gostos. Mas houve um tempo que esse presente só me trouxe lágrimas, e essa foi uma das vezes que quase tentei me desfazer de todo aquele presente. Porém achei melhor guarda-lo no ponto mais baixo do guarda roupa, abandonei todo meu presente ali. Abandonei porque eu o odiei . Odiei porque não veio com clausulas de uso. Simplesmente me foi atirado num dia treze qualquer. Sem cartão de felicitações, ou remetente de envio.
Ganhei meu presente sem saber que ele iria me tirar todos os entes queridos, então aprendi seu preço . Aprendi que para cada ganho haveria um voto de tristeza. Sempre me fazendo optar em abandonar o presente em algum lugar. Então tive medo de compartilhar meu presente com os outros. Até que veio ela, tinha o mesmo presente que o meu. Tinha gosto por ele e simplesmente não ligava para clausulas invisíveis. Simplesmente aproveitava o presente dado por aquele desconhecido com todas as suas possibilidades. Não importava com nenhuma reação, desfrutava de todas as oportunidades e quando a tristeza chegava cultivava a alegria de lembrar os pontos positivos do presente. Ver ela! Notá-la me motivou a tirar o presente de dentro do guarda roupa e compartilhar uma vez mais, junto a ela. E assim eu aprendi que podíamos partilhar aquele presente com alguém que também quisesse partilhar conosco.


Dali em diante compreendi o objetivo desses presentes embrulhados em papel de hospital: Ser compartilhado com a pessoa que mexe com os teus olhos. Um presente compartilhado é sempre melhor do que um presente guardado.Nosso presente entretanto, foi esgotado, acho que isso faz parte das clausulas do remetente. Durável quando compartilhado e inesgotável pra você mesmo.
È o limbo de cada presente. Na verdade não passa de um “upgrade” vindo de fabrica. Quando você compartilha o seu presente com a pessoa errada ele volta drasticamente defeituoso. E não há assistência técnica que resolva. Trocam os fios, moldam o visor mais aquele defeito sempre permanece de alguma maneira. Consegui restaurar meu presente, lixei suas bordas acrescentei uma nova pintura e refiz todas as ligações eletrônicas. Meu presente ficou assim meio desgastado meio enfadonho por algum tempo. No entanto ainda tinha meu presente e decidido assim comecei a aproveitá-lo como se ele estivesse inteiro. Subi as escadas e mostrei a ele diante todos... E orgulhoso disse:

—Meu presente é isso! O sol brilhando em cores de despedida. A noite linda e calorosa. O comecinho da manhã intocada pelo dia. Quem quiser pode desfrutar do que brilha no meu visor. Quem quiser pode vir brincar junto e celebrar a vida. Quem quiser pode desfrutar desse presente meu! Desse céu de setembro. E quem tiver um presente parecido, por favor, me empreste e vamos dividir a brincadeira e fazer uma junção! E brincar... Brincar de existir.