domingo, 11 de outubro de 2009

Ocasionalmente perto... Propriamente juntos!


Seu nome era de pão francês, desses que vendem frescos na padaria. Possuía cabelos negros e um conceito meio de algodão doce em dia de parque. Seu sobrenome era de profeta judaico, sol nascente de algum lugar afastado. Portador da espada de chamas do Monte Carmelo.

Ele curtia a Kiss FM, gostava de uma Anna e andava pensando no último fim de semana.

Todo dia na mesma sina ele bocejava com seu último nome de poeta português. Escritor de cartas. Três siglas que o denominavam na chamada do médico.

Ele perdera a carteira em cima de um banco. Lamentou o encanto e sempre fora assim, leso demais com esses objetos sem sentido.

Ele ouvia Pink floyd, pois sentia esperança. Tinha paladar aguçado e gostava de misturar canela em algum ensopado. Trazia consigo uma semente no bolso, lembrança daquela primavera que gritava cigarras nos troncos de pau Brasil. Ele se sentia feliz com coisas bobas e triste com coisas difíceis.

Ele andava na rua quando encontrou Ela. Ele ficou abismado, Ela nem notou que Ele existia.

Ela tinha tatuagem de fada, usava óculos escuros e gostava de anarquia. Tinha sobrenome de princesa e dançava Flamenco na Padaria. Tinha pernas robustas e prezava pela vida das árvores. Gostava de pedra Letícia e daquela música triste do Caetano. Ela tinha o coração partido por um tal de João. Ela tinha nome Italiano de beleza iminente. Gostava da essência das rosas e de sereno em manhã fria. Ela gostava de ser beijada no pescoço e de massagens imprevistas na palma da mão. Tinha o último nome de planta antiga.

Ela poderia ter amado Ele, Ele poderia ter gostado dela.
Mas apenas se cruzaram no meio da rua.

Ocasionalmente perto, propriamente juntos. Só precisavam de um bom dia. Ou quem sabe um abraço...

Ele e Ela. Ela e Ele. Fatidicamente desconhecidos.

4 comentários:

Luiza Callafange disse...

Essa história me lembrou muito um poema da minha mãe, de num sei quanto tempo atrás..."Desencontros"
Eu não sei se ele ainda existe, mas era algo do tipo:
"Você vem, eu vou
Você chega, eu não estou.
Você marca, esqueço.
Você liga, desapareço." (...)

Eu não lembro dele todo, mas terminava assim:

"Você é dia, eu sou noite
Você é sol, e eu sou lua.
Nossa vida é um desencontro,
Você não é meu, eu não sou sua"

As pessoas que mais podem nos amar na vida podem ser aquelas que nem olhamos na cara e passamos do lado, no supermercado...Vai saber!

Luciane disse...

"Ocasionalmente perto... Propriamente juntos". Isso me faz pensar se as pessoas com rostos recém inventados por uma noite existem na realidade. Criar um rosto para um segundo de sonho? Será? Quando era muito jovem, um rapaz me pediu em casamento na estação Vila Mariana. Lembro-me bem que me seguiu por estações, escadarias acima, escadarias abaixo e pondo-se à minha frente disse: "- Quer se casar comigo?" Recusei, é claro, não por pretensão ou coisa parecida, fui racional demais num tempo em que poderia sonhar sem medo algum. Ele sorriu agradecendo minha atenção, mas que iria me reencontrar pra renovar o pedido. Achei estranho e bonito, mas não tomei aquilo como profecia, porém, ainda hoje quando desembarco na Vila Mariana me lembro dele: a roupa clara, o sorriso claro, os cabelos quase claros. Talvez ele nem se lembre mais de mim. Procuro não mudar muito meu jeito de sorrir e de subir as escadas, sempre olho pra trás na esperança de ver o rosto novo de alguém tão corajoso e recém inventado, talvez tenha descoberto o dom da poesia e deixou de garimpar sonhos em lugares comuns. Somente os poetas têm esta coragem à flor da pele, de se confrontarem com a necessidade mais profunda de serem atendidos num sonho, mesmo que pareçam banais.

Lindo texto, os seus sempre me fazem pensar. Parabéns.

Michelle disse...

Belíssimo!
Me lembrou o filme “Encontros e Desencontros”, tem uma cena em que Bill Murray (Bob Harris), canta More than this no karaokê para uma quase desconhecida que tem uma sintonia incrível com ele. Amei o blog, tudo o que li, e obrigada por me fazer refletir sobre esses possíveis amores que deixamos passar seja no trem, na padaria, no shopping... Parabéns!

Michelle disse...
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