domingo, 30 de novembro de 2008

Crônicas De Mim Mesmo "Num Dia Como Outro Qualquer"


Movo meu corpo puxo o edredom, nesse exato momento estou dormindo. Acho que estou num sono pesado... aqueles cuja expressão popular é: “mais apagado que defunto”. Viajo entre as sete esferas, quando escuto o celular tocando. Reviro algumas vezes na cama pensando que a vida de largado não é tão ruim assim. Lembro que meus olhos pregaram às oito da manhã, depois de uma madrugada colada na difícil tarefa de finalizar a mensagem num manuscrito. "Droga!!!
"Penso comigo, quando o barulho finalmente me desperta.
"Não se pode tirar um dia de largado sem que o mundo saiba de sua existência?" Caminho procurando incessantemente pelo maldito celular crendo que duendes realmente existem, porém não são tão afáveis como as lendas retratam.. Na minha opinião duendes são gatunos de mão cheia. Nada místicos, pelo contrário, são aliados ao governo no setor de saque a pessoas lesadas. Pegam celulares, agendas, livros e até objetos maiores como note books, com uma única finalidade: leiloar todos esses objetos perdidos no mercado mitológico chinês! Acredite, existem mais duendes do que sua vã filosofia pressupõe!!!
Depois de alguns segundos vasculhando da cama até o chão, tentando definir onde diabos "guardei" o maldito celular... Avisto uma luz vinda do guarda roupa! Não há outra explicação, parece que o duende se esqueceu de levar o celular. Desviando das folhas, roupas, livros e tudo mais que cobre o chão do meu quarto, puxo a gaveta do guarda roupa... Um espanto! E me pergunto o que o celular faz na gaveta de meias?
–Alo!—Digo, atendendo a chamada. Tentando esconder a vontade falar:
Mas que porra! Será que não posso fingir que sou um vagabundo por um dia. 
Alguns segundos de silêncio se passam, será que a máfia russa descobriu minha identidade secreta? Se for isso estarei eliminado antes do almoço...
—Vai ter jogo hoje? — pergunta a voz. Que agora me parece mais familiar, e para o meu alivio sem nenhum sotaque russo!
“Ufa!” reflito aliviado comigo, meu codinome “Clebervasks” está seguro!
—Caralho! Cleber? Você Dormiu de novo?
A expressão me levou a identidade do individuo.
—Biro! Então é você— Biro que na verdade é André! È o desgraçado que sempre me acordou com toques polifônicos depois das onze.
—Quem você pensou que era? Seu babaca!
—A máfia Russa!
—È! Você ainda está dormindo... Queria saber se vai rolar jogo hoje?
Rolar jogo seria na linguagem “Biriana” (também conhecida como dialeto dos Ogros) se haveria naquele momento um jogo de RPG ou “jogo de interpretação de Personagens”(Vide Wikipédia jogos de RPG). Muito comum entre, loucos,nerds e pré historiadores.
—Não! Tenho que terminar uns negócios aqui em casa.
Respondo, querendo saber por que as pessoas se viciam em meios de lazer tão comuns? RPG é um lazer como outro qualquer. Òtimo para o desenvolvimento intelectual, mas com o péssimo valor de fugir da realidade por alguns minutos! È uma pena que alguns jogadores se deixem levar tanto por um jogo...
—Beleza!
Finalizou ele com a voz meio abatida. Diariamente eu tinha que agüentar o vicio de alguns amigos pelo RPG. Às vezes (na maioria delas) eu nem estava com vontade de jogar e mesmo assim o fazia. Sabendo que é necessário para alguns essa fuga do meio. Porém minhas responsabilidades seguiam para finalizar aquela carta. Afinal eu havia prometido a ela!
Havia prometido que responderia a carta, mas fui deixando até ao último badalar, empurrando com a barriga até o ultimo dia da semana.
Naquele momento liguei o som num volume com que pudesse fazer as janelas tremerem.
Som para poder gritar, berrar com o refrão mais forte. Concordando com a estrofe que dizia algo como: Gritar até o ponto que a vizinhança ouvisse tua voz.
È ,eu gritei, mas quando olhei para porta, bem! Não era a vizinhança... Pelo contrário, eram olhos aterrorizantes numa mistura de castanho claro emoldurados em lentes de vidro embaçadas. Acredite, os piratas antigos temeriam ao olhar dentro daqueles olhos esmorecidos!
Temendo o olhar percebi que não cantava mais, o som desaparecera! Até que a dona dos olhos de vidro disse calmamente como se o som não existisse:
— Você por acaso é surdo? Pra que um som nessa altura?
A típica fala de minha mãe, cheia de interrogações! È ela a dona dos olhos de vidro. A única que chegava de surpresa inesperada, cheia expressões peculiares. O único modo de chamar minha atenção, talvez.
— Sério! Pensei que estávamos numa festa, dai pensei em agitar o esqueleto o que você acha?
Respondi dançando no modo desajeitado que somente duas coisas eram capazes de induzir: café, amor e euforia! Eu sabia que mesmo sendo uma dança forçada abriria um riso naquela face materna. E foi o que aconteceu, depois de alguns minutos pensando como fora "criar um filho tão insano" ela riu e seguiu em direção ao corredor sem dizer mais nada. Depois disso abaixei o som (ou pensei ter abaixado) peguei as folhas que estavam em baixo de alguns cadernos no chão e fechei a porta. Meus olhos passaram de relance pelos titulos dos livros, mas somente um me fitou a carne. Dizia com um cupido desenhado na capa: “O amor nos tempos do cólera”.
Fantasmas entraram pela janela naquele momento. Pensei nas palavras antigas do passado enquanto “Iris” saia das caixas de som e me visitava na cama. Olhei para o teto enquanto sentia aquelas frases acariciando minha face. De alguma forma minhas palavras saiam pra dentro, sem fala alguma... “Iris” dialogando com meu coração! Dizendo: "Pegue está frase... Pegue essa canção. Pois neste momento ela é sua, mais do que jamais foi "
As frases oscilavam: “Tudo que eu sinto é este momento, tudo que eu respiro é a sua vida”.
Eu rodopiava em cenas angustiantes enquanto as falas traduziam o que meus olhos negavam em transparecer. Íris que me cegava aos poucos! Acabando pouco a pouco com os meus sonhos... Os quais achei que era real.
— Cleber?
Alguém me chamava na porta...
Voltei para realidade do quarto bagunçado. O nanquim ainda estava ali intacto, o vento balançava o pingente da janela. Tive a impressão que os fantasma haviam ido embora. Afinal algo sempre levava meus fantasmas, no entanto uma hora ou outra eles estavam de volta!
Abri a porta me deparando com meu pai... Avisou ele num tom grave parecido com meu:
— O Gil ta ai.
— Tudo bem? Fala pra ele que eu já vou.
Respondi. E compreendendo a mensagem ele seguiu em silêncio.
Meu pai, parte Tupã e outra John Waine... Cara fechada, modo silencioso de andar e fala interrupta. Sim! Meu pai era mistura tipíca de cowboy de western com a fisionomia de Indio Brasileiro! Portador do coração mais terno que já distingui numa pessoa. Entretanto quem o conhecesse a primeira vista teria outra impressão... A impressão que ele esmigalharia seu fígado e comeria no almoço. Era o que a face dele dizia num primeiro contato! Pois assim que meu pai abrisse a boca ou sorrisse seu coração falaria mais forte. Talvez fosse por este motivo de alma afável que as crianças o cercavam frenquentemente. Mesmo com estilo de justiceiro solitário que tentava aparentar, as crianças o encaravam como um personagem lúdico de algum mundo distante. Enxergavam a alma doce que ele tanto tentava esconder, sempre sorrindo...
—Meu pai—Disse olhando o meu reflexo no espelho— Simplesmente essas sobrancelhas gigantes pertencem a ele. Isso deve ser o que dizem sobre ter uma herança genética!
Deixei o espelho de lado e segui em direção ao corredor, fui até a cozinha onde avistei minha mãe na área de serviços, calçando suas famosas botas de borracha azul.
— Seus porcos! Como podem fazer tanta sujeira? Isso não é coisa de cachorro!
Dizia ela para os cães. Aquele dialogo e aquelas botas azuis, só poderiam significar uma coisa... Minha mãe estava tendo o seu famoso ataque de limpeza desenfreada! Ela começava pelo banheiro com baldes de água e terminava com um jato potencializado de super ducha nas janelas dos quartos. Acordando quem dormia e dizendo: To limpando!
Na verdade, tenho absoluta certeza que essa manifestação de limpeza vinha de alguma entidade sobrenatural que habitava os recipientes de produtos higiênicos. Aquelas embalagens faziam sons guturais sem que ninguém as apertasse. Algo do mal morava nos litros de desifetante e nas embalagens de limpa-vidro. E era só a minha mãe tocar em algum desses produtos de limpeza que logo calçava as botas, vestia seu avental e prendia o cabelo para trás. Aquele era o seu fardo para guerra, e os cães os inimigos da batalha, pois mijavam e cagavam desafiando a ira do soldado de botas azuis!
Deixei de lado disputa pelo quintal, enchi minha caneca branca de café e segui caminho até a sala. Passei entre os sofás e desci as escadas para chegar até à locadora. Lá me deparei com Gil vulgo Gilson (também conhecido como boneco de Olinda ambulante). Naquele momento eu questionava porque maldições uma vez não podia ser uma garota que viesse até mim.
Uma garota de olhos azuis com lábios vermelhos e cabelos castanhos claros. Com um interesse por literatura cujo um dos princípios de vida fosse compartilhar momentos de amor ao meu lado. Me confortando nos dias escuro, suportando-me nos dias de chuva e discutindo o que fosse necessário para que pudesse entender as razões do que é mesmo isso que dizem ser amor. E claro me dando espaço para oferecer o mesmo em troca.
— Fala Cleber!
Cortou Gil do outro lado do balcão quando eu ainda procurava entre as prateleiras de DVDs o semblante da garota de cabelos castanhos, como se ela realmente existisse... Mas no fim só enxerguei capas de filmes antigos!
— Fala Gil!
Respondi num voz meio abatida, voltando outra vez para realidade daquele dia.
— Ou! Ta fazendo o que? O som tá mo alto...
Perguntou Gil. Quando eu me questionava mentalmente se tinha ou não abaixado o volume do som... Talvez tenha aumentado de novo, vai saber!
— To terminando uma carta... Entra ai!
— E como tá saindo a carta?
— Tá meio foda, porque to tentando escrever com pena e nanquim. Mas, sei lá! Não levo muito jeito com pena. Quer ver a carta?
— Tá! eu trouxe uns jogos de PC se liga—Disse ele mostrando os jogos por cima do balcão— se quiser eu instalo pra você.
— Beleza! Faz assim então... Eu acabo a carta e você fica instalando os jogos no PC da sala, daí quando eu terminar te mostro como ficou os traços. Chega ai?
Convidei Gil para entrar novamente. Deixei ele no computador e voltei para o quarto.
As luzes permaneciam apagadas, sendo a aresta de sol que vinha da janela a iluminação necessária para causar um animo de:
“uall vamos acabar logo com isso Sir Cleber de Vazqtow".
Mãos a obra, pena em mãos e logo as letras sairam cuidadosas. Um borro ali, uma mancha que logo foi transformada em desenho. Parece que minha veia artística vem do escuro. Idéias desaparecem e o relógio anuncia que já são.... o que? Quatro horas!!!
Entorno traços rápidos, girando desastrosamente a folha. Coloco enigmas abstratos e assino meu nome... Enfim a carta está terminada! Meu sangue de escritor fica orgulhoso (mesmo sabendo que o correio fecha as cinco e minha casa fica vinte minutos afastados do centro). Apresso minhas pernas e vou até sala gritando como se uma bomba relógio fosse estourar naquele momento.
— Gill!!!!!!
O garoto quase caiu da cadeira com a estridência do grito, acho que ele também sentiu a presença do disparar assassino do relógio...
— Que foi meu! Tá louco?
— Cara! São quatro horas... O correio fecha as cinco e eu preciso entregar essa carta!!! È uma questão de honra...
— Deixa pra amanhã!
— Amanhã é sábado, acho que os correios não abrem sábado!
— Segunda?
— Você não ouviu sobre a questão de honra? Eu passei uma semana enrolando, é hoje ou nunca!
— Tá! Então vamos.
— Vamos—Disse andando sozinho em direção a porta—Que foi Gil? Se não vai cassete!
— Vou! Mas você vai assim...? Sem camisa e com uma bermuda rasgada?
Foi quando reparei que eu estava parecendo um caiçara... Só faltava o chapéu de palha.
A pior coisa, era que havia me esquecido de colocar a carta no envelope junto com as outras surpresas que tinha preparado para enviar junto.
Me fitei no espelho... Enxerguei uma postura desajeitada que fazia dos passos tortos e daquela face risonha meu nome. Em menos de dez minutos estava com minha camisa preta favorita, meu cristal preso ao pescoço e a carta prestes a ser entregue. Só faltava aquele detalhe mínimo de chegar no correio em menos de trinta minutos!
Saímos de casa, Gil e eu com a missão destrambelhada de chegar ao correio a tempo.
— Espera!
Agucei.
— O que foi agora?
Perguntou o que seria a versão alta de Sancho Pancha, Gilson.
— Esqueci minha carteira, dá um tempo ai...
Respondi enquanto corria de volta ao castelo, quer dizer, até minha casa!
Na verdade eu não havia esquecido a carteira, mas havia esquecido a cabeça certamente. Ao abotoar a camisa quando ia descendo a rua, percebi que os botões da mesma camisa estavam para dentro sendo que a camisa em si estava do lado errado . Daí tive a brilhante idéia de correr para casa e vestir a camisa do lado certo . Até porque não queria ouvir sarros dizendo:
“nossa cara, como você é lesado” .
Depois de arrumar a camisa (dentro de casa, longe de olhos humanos a não ser os meus). Voltei a tempo para notar que os ponteiros não haviam parado. Coisa que aprendi muito rápido desde pequeno: O tempo decola!.
Em menos de cinco segundos estava de volta à rua, agora com a camisa do lado certo. Botões da camisa fechados e os pés no asfalto, meu corpo transpirava com o co2 liberado pelas carretas.
— Cara, não vamos chegar a tempo!!!!!!!!!!!!
Essa era umas das diversas frases pessimistas que Gil proferia enquanto desviávamos das pessoas apressadas na calçada. Para piorar quando eu olhava para as nuvens tinha certeza que ali continha sinais de chuva. Foi ai que entendi o pessimismo do meu amigo, mal haviamos saído de casa e os sinais da lei de Murphy aconteciam! Eu Havia tropeçado em três quinas e no ultimo semáforo, um carro quase acabou com os meus sonhos de chegar a vinte um. Portanto enxergar as portas do correio fechadas era uma hipótese bem apropriada para o pessimismo do dia!
— Acho que só vamos saber quando chegarmos né!
Afirmei encerrando o assunto sobre o pessimismo, e do pouco tempo que nos restava.
Depois de algum tempo estávamos em Brás Cubas. Em menos de duas ruas, ao lado do fórum municipal residia o correio. Meu objetivo estava quase sendo concluído. Quando com os dedos pigmentados de nanquim e um sorriso no rosto, avistei a maior fila que já vi para entrar num correio!!! Espantado as únicas palavras que saíram da minha boca foram:
— Caraca! Mas que merda é essa?
Não que aquilo fosse literalmente uma merda, na verdade eram varias pessoas formando o que as tias da pré-escola definiam como trenzinho da alegria. Filas para mim formavam um sentimento de porre globalizado.
— Será que ninguém conhece a praticidade de um e-mail por aqui?
Remungou Gil assim que pregou os olhos na fila.
Parado algum tempo na fila, notei que poucas pessoas estavam com cartas na mão. Um senhor segurava um caixa do tamanho de um televisor, já uma moça tentava organizar as contas do fim do mês. E quanto eu, simplesmente tentava colar o envelope com uma liquido que parecia um musgo branco.
Cartas sociais.... Bem elas eram um padrão pra mim! Gostava de escrever cartas, mesmo não tendo uma letra muito qualificada para isso.
Cartas faziam parte do ser romanesco que permanecia em meu âmago.
Palavras doces para uma vida que se mantinha cítrica.
Palavras que circulavam em sentimentos, tornando meu mundo movimentado.
— São cinco reais senhor?
— O que????
Absurdo! Pensei quando chegou minha vez de quitar para enviar palavras e outras surpresas para uma Anna que se tornou Ziza.
— Está aqui..
— Obrigado! O correio agradece.
Foram as últimas palavras que ouvi da atendente dos correios, foi exato pra mim. Provando que meus objetivos haviam acabado. Demonstrando que o dia chegara ao seu fim e nada me restou, além de falar de jogos e voltar para casa. Ainda tive tempo de me despedir dos amigos e respirar por ter vivido um dia que comparado a tantos outros foi de uma dimensão comum, mas com grandes ações.
Mais um dia na minha vida, mais um X no calendário.... Outro dia como tantos outros que ainda virão, ainda solicitando a esperança que serão cheios dessa mesma satisfação que tive num dia como outro qualquer!

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